Maria Bethânia Galvão – Acadêmica do 4º semestre de Relações Internacionais da Unama

O movimento de independência da Angola foi um projeto de contínua construção frente à secular colonização portuguesa na região, e que já não apresentava sustentação de prosseguir, a qual impedia os próprios angolanos de possuírem soberania, outrossim, o processo de independência representou uma disputa de interesses para a comunidade internacional e para os países regionais do continente africano, na tentativa de firmar um hegemon regional durante a Guerra Fria.
Em primeira instância, influenciados pelos movimentos de libertação africanos que ocorriam durante os anos 50/60, surgiam os movimentos nacionalistas angolanos, diferenciados pelo alinhamento ideológico. Nesse sentido, o MPLA possuía referencial marxista-leninista, assim como sustentou um programa revolucionário para a Angola independente, aproximando-se do campo soviético e cubano, por sua vez, o FNLA carecia de um planejamento estruturado para o país, de forma que seu alinhamento anticomunista uniria os interesses norte-americanos e o sul-africano para combater o MPLA (SILVA, 2016, p. 157).
Em sequência, as ações militares de guerrilha para expulsar os colonos portugueses esteve sob o comando do MPLA, com início em 1960, sua atuação teve êxito em reeducar a população por meio da efetivação de campanhas de conscientização que fomentaram uma autoimagem positiva de unidade nacional, sob o discurso da classe (SILVA, 2016, p. 165). Como resultado disso, em 1975, os movimentos nacionais, junto ao governo português, uniram-se para assinar o Acordo de Alvor a fim de firmar uma data para a independência, estabelecendo-a em 11 de novembro de 1975, ficando constituída a República Popular da Angola. Tal estabelecimento não foi pacífico por razões de divergências internas entre os grupos de libertação acerca do modelo de plano estatal a ser seguido, além de disputas sobre as suas influências no território.
Embora todos os movimentos tivessem por objetivo a libertação de Angola, existiam divergências entre eles, as quais, depois da proclamação da independência, levariam a guerra civil que durou vinte e seis anos (SILVA, 2018), e que finaliza sob muita pressão externa, protagonizada principalmente pela Organização das Nações Unidas nos anos 90. O peso das estruturas econômicas e sociais herdadas do período colonial, a Guerra Civil Angolana e a derrocada da URSS, assim como as pressões econômicas neocolonialistas, serviram como fortes entraves à conquista das principais metas de governo do MPLA – que, em 1990, abandona a sua orientação marxista-leninista e convoca eleições aos moldes das democracias liberais (PRECIOSO, 2018).
As consequências do processo de independência de Angola reverberam na sociedade do país até a atualidade, para compreendê-las se considera as condições socioeconômicas do país tanto na colonização quanto após a descolonização. A utilização dos angolanos como mão-de-obra barata e exploração das riquezas minerais da região, assim como o racismo institucionalizado, foram marcas deixadas pelo colonialismo português em Angola, o qual foi imposto no país como lei administrativa e política (SILVA, 2018 apud Linhares, 1981). Esse último foi um fator considerável que refletiu na disputa entre os grupos de libertação do país, considerando que a natureza violenta do processo de colonização é passada para seu reflexo, a descolonização. Assim sendo, a violência desumanizadora do colono transforma-se dialeticamente na violência legítima e formadora do colonizado (SOUZA & SELIS, 2021).
A partir dessa perspectiva decolonial de análise, é possível questionar o posicionamento da África no sistema internacional, relacionando-a com a construção da luta anticolonial que permitiu os países do continente a estabelecerem sua própria realidade, superando a subjugação pela hegemonia econômica vigente. Nesse ponto de vista, é válido reconhecer o estudo do pós colonialismo como crítica literária, interessada em interrogar particularmente as representações tradicionais sobre colonizados e ex-colonizados, de forma a elaborar uma crítica a todas as formas de poder colonial, seja ele cultural, econômico e político, passado ou presente (TOLEDO, 2021).
Dando importância a abordagem ao longo do texto, a leitura decolonial se faz necessária, pois proporciona a compreensão da construção de valores de identidade histórica, para além de pressupostos ocidentais enviesados sobre esse processo. Em concordância a isso, se estabelece que o nacionalismo africano antecede o colonialismo, de maneira a entende-lo como processo que fomentou os povos a não sucumbirem a qualquer autoridade se não a sua própria (KHAPOYA, 2015), elevando-os a autores de sua própria história.



REFERÊNCIAS:


KHAPOYA, Vicent B. A Experiência Africana. Editora Vozes: 2015.


PRECIOSO, Daniel. Um projeto socialista de reconstrução nacional: o discurso do presidente Agostinho Neto na proclamação de independência de Angola (11 de novembro de 1975). Temporalidades – Revista de História, ISSN 1984-6150, Edição 28, v. 11, n. 1 (set./dez. 2018).


SELIS, Lara Martim Rodrigues. SOUZA, Natália Maria Félix. Resistência Política e (Im)Possibilidades da liberdade entre Frantz Fanon e Ashis Nandy; TOLEDO, Aureo. Perspectivas Pós-coloniais e Decoloniais em Relações Internacionais: a parte que nos cabe nesse processo. In: Perspectivas Pós-coloniais e Decoloniais em Relações Internacionais. Salvador: EDUFBA, 2021.


SILVA, Antonio Carlos Matias. Angola: história, luta de libertação, independência, guerra civil e suas consequências. NEARI Em Revista: V.4 N.5 2018.1.