Thaís Carvalho, acadêmica do 5° semestre de Relações Internacionais

Ficha técnica:

Ano: 2023

Direção: Yorgos Lanthimos

Distribuição: Walt Disney Pictures

Gênero: Drama, Comédia, Ficção

País de Origem: Estados Unidos, Irlanda, Reino Unido

Inspirado no livro homônimo escrito por Alasdair Gray, “Pobres Criaturas” teve o seu roteiro adaptado por Tony McNamara e dirigido pelo renomado diretor Yorgos Lanthimos, tornando-se um dos filmes mais aguardados e aclamados da temporada de 2023, recebendo 11 indicações ao Oscar e levando 4 deles, incluindo o de Melhor Atriz para Emma Stone por seu papel de Bella Baxter (O Globo, 2024).

O longa retrata a história da jovem Bella, que após o seu suicidio é trazida de volta à vida pelo cientista Godwin Baxter (Willem Dafoe). Sendo uma representação feminina de Frankenstein, Bella torna-se um experimento de God após ter seu cérebro trocado pelo do bebê que esperava. Sendo uma adulta com mente de bebê, Bella terá o processo de socialização retratado ao longo do filme, haja vista que inicialmente a personagem é descrita como uma criatura frágil e sem conhecimento que necessita estar enclausurada dentro da grande mansão do cientista.

Ao longo da trama, Bella passa a se desenvolver intelectualmente, descobrindo as pequenas felicidades e tristezas da experiência humana, desde se alimentar, dançar, ler, conhecer a sexualidade, explorar novos países e conhecer novas pessoas. E é desse modo que Baxter conhece o sedutor Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo), com quem decide partir em uma aventura ao redor de diversos países em busca de liberdade e autoconhecimento. Iniciando sua aventura em Lisboa, Portugal, Bella é contemplada com novas experiências, como o sexo – que passa a ser um fator central de seu relacionamento com Duncan-, e os saborosos pasteis de nata que experimenta na cidade, representando, naquele momento, o seu processo de libertação do controle de seu criador e o início da relação de controle de seu corpo exercida pela presença de Wedderburn.

É inegável que com a sua fotografia e cenários peculiares e ousados, “Pobres Criaturas” representa todo o processo de autoconhecimento de Bella Baxter, desde takes expressos principalmente em preto e branco, demonstrando a mente infantil de Bella, até as intensas cores e diálogos profundos ao longo de suas viagens e aventuras, demonstrando assim, o seu processo de autoconhecimento sem a influência da mão invisível das normas sociais, como o patriarcado, a cultura ou as vontades impostas a figura feminina (Pellicano, 2024).

O longa-metragem, apesar de ser escrito e dirigido por homens, retrata explicitamente, através da figura de Bella Baxter, críticas à exploração e controle exercido sobre o corpo das mulheres e suas vontades, a identidade, abordando também temáticas como a libertação das amarras sociais e o empoderamento feminino, expressos através dos pensamentos e ações da protagonista. Por isso, pode-se analisar a obra por meio da Teoria Feminista das Relações Internacionais, abordagem esta que concentra-se principalmente em analisar e explicar a assimetria existente nas relações de gênero e a composição de identidade maculina e feminina nas instituições e normas do sistema internacional (Monte, 2013).

As teóricas feministas V. Spike Peterson e Anne S. Runyan em sua obra “Global Gender Issues in the New Millenium” (2015), analisam as divisões de poder e o modo como os recursos de gênero contribuem para as crises mundiais, seja de sustentabilidade, violência ou representatividade. Abordando brevemente as duas perspectivas de análise das RI desenvolvida pelas autoras, chamadas de “posição das mulheres” e “poder do gênero”, pode-se compreender que a primeira está ligada diretamente a aspectos subjetivos, isto é, ao analisar as posições das mulheres na sociedade, podemos perceber as diferenças de gênero expostas na obtenção de recursos, seja ela através do poder e autoridade, demonstrando assim como as mulheres são marginalizadas nas discussões (Oliveira, 2022).

Na segunda perspectiva, o “poder do gênero” seria as delimitações feitas pela estrutura de poder existente nas RI, cujo cerne é extremamente masculinizado e por conseguinte hierárquico, o que dificultaria ainda mais a inserção das mulheres nestes debates e espaços. Assim, torna-se nítido que o debate levantado por V. Spike Peterson e Anne S. Runyan foi essencial para o surgimento de mudanças nas relações internacionais, haja vista que trouxeram uma discussão sobre como as formas de poder existentes nos âmbitos interno e externo da sociedade são utilizados para o controle das estruturas de poder legitimadas no gênero (Oliveira, 2022).

“Pobres Criaturas” expressa através da figura de Bella Baxter, o processo de (des)contrução da figura feminina na sociedade, buscando romper com as amarras impostas pelos homens sobre o seu corpo e suas ideias, tal qual a Teoria Feminista vem modificando a base masculinizada da área, alcançando, assim, uma maior inserção da figura feminina nos espaços de discussão e pesquisa das relações internacionais.

REFERÊNCIAS:

MONTE, Izadora Xavier do. O debate e os debates: abordagens feministas para as relações internacionais. Revista Estudos Feministas [online]. 2013, v. 21, n. 1. p. 59-80. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ref/a/r3pc8yVXBf6FqHPBBcH9Xxy/# . Acesso em: 14 de abr. de 2024.

O GLOBO. “Oscar 2024: ‘Oppenheimer’ e ‘Pobres Criaturas’ são os grandes vencedores da noite”. 2024. Disponível em: https://oglobo.globo.com/cultura/filmes/noticia/2024/03/10/oscar-2024-confira-a-lista-completa-de-vencedores-da-premiacao.ghtml . Acesso em: 14 de abr. de 2024.

OLIVEIRA, Keity Silva de. Grandes autoras de Relações Internacionais: mulheres que moldaram as teorias de R.I. Internacional da Amazônia, 2022. Disponível em: https://internacionaldaamazonia.com/2022/03/04/grandes-autoras-de-relacoes-internacionais-mulheres-que-moldaram-as-teorias-de-r-i%ef%bf%bc/ . Acesso em: 14 de abr. de 2024.

PELLICANO, Raquel. Sobre o ‘Cadáver Exquisito’ de Bella Baxter. F/508. 2024. Disponível em: https://f508.art/blog/review-pobres-criaturas-fotografia . Acesso em: 14 de abr. de 2024.