Larissa Schoemberger – Internacionalista

As discussões sobre mudanças climáticas dentro do cenário internacional surgiram por volta do século XX, a partir de conferências como a Primeira Conferência das Nações Unidas Meio Ambiente e Desenvolvimento em Estocolmo, que em 1972 cria a ideia de desenvolvimento sustentável surgindo do conceito de ecodesenvolvimento, proposto durante a conferência. Mas o tema começou a ganhar certa notoriedade a partir do século XXI com as tentativas de implementar a Agenda 21 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Uma das consequências das mudanças climáticas, além dos extremos climáticos como tempestades tropicais, inundações, ondas de calor, seca, etc, são os refugiados climáticos e/ou ambientais. Como se sabe o conceito de refugiados de acordo com o ACNUR (1951) e seu protocolo adicional (1967), são pessoas que por algum motivo tiveram que sair do seu país, por causa de conflitos internos como guerras civis ou por temores de perseguição com questões de raça, religião, nacionalidade, grupo social, e opinião política.

Podemos observar que o termo ‘refugiado ambiental’ ou motivações tais como catástrofes ambientais ou climáticas não são referidas no estatuto do refugiado de 1951 e nem em seu protocolo de 1967. O termo de refugiado ambiental só foi apresentado em 1985, “pelo professor Essam El- Hinnawi, do Programa da ONU para o Meio Ambiente” (BARBOSA, s/d, online). O termo se refere a populações que são forçadas a sair do seu local de origem por conta das catástrofes ambientais ou climáticas, principalmente, apesar dos avanços em prol do reconhecimento do refugiado ambiental pelo direito internacional não existe interesse em ampliar esse conceito, principalmente pelos atores estatais que estão tentando limitar o direito dessas pessoas.

O não reconhecimento dessa motivação para solicitação de refúgio, do ponto de vista do direito, já se enquadra como um dos primeiros e principais desafios para os refugiados climáticos visto que isso impede essas pessoas de buscar proteção. Outro desafio atrelado a isso seria da perspectiva política e social, em razão da grande parte dos opositores ao reconhecimento do conceito serem os criadores de políticas dentro dos Estados.

Outros desafios enfrentados pelos refugiados ambientais são as próprias mudanças climáticas que além de ampliar o fluxo de deslocamento no mundo torna a vida daqueles que já foram forçados a se deslocar mais desafiadora, a pobreza pois as populações mais pobres estão mais suscetíveis a serem vulneráveis aos efeitos climáticos devido a falta de equipamentos para se preparar e prevenir a essas mudanças, com menor capacidade adaptativa, aumentando a crescente desigualdade global, e por último os impactos que a crise climática causa nos meios de subsistência dificultando as pessoas de serem autossuficientes, principalmente aquelas que estão em deslocamento.

Partindo do prisma conceitual, temos a segurança humana que é um conceito muito usado dentro das relações internacionais por teóricos das escolas de segurança. A segurança humana foi criada e definida em 1994 no Relatório de  Desenvolvimento Humano (RDH) do Programa das Nações Unidas para o  Desenvolvimento (PNUD). De acordo com o relatório do PNUD de 1994, podemos elencar sete  categorias que ameaçam a segurança das pessoas. São essas: econômica, alimentar, na saúde, ameaça ambiental, pessoal, da comunidade, e política (PNUD, 1994, p.28).

Vale ressaltar que na América Latina existe o reconhecimento dos refugiados ambientais graças a Declaração de Cartagena de 1984, na Colômbia, no Colóquio sobre Proteção Internacional dos Refugiados na América Central, México e Panamá denominado Problemas Jurídicos e Humanitários “[…] já que refugiados ambientais sofrem graves violações de direitos humanos quando a ausência de um meio ambiente equilibrado exige que abandonem suas casas e os forçam a uma migração” (DANIELE; PAMPLONA, 2017, p. 219).

No Brasil já existem algumas movimentações referentes a pautas das mudanças climáticas como a Conferência Brasileira de Mudança do Clima (CBMC) que teve sua primeira edição em 2019, a CBMC “é um encontro anual que reúne organizações não governamentais, movimentos sociais, povos tradicionais, comunidade científica e os setores público e privado” (CBMC, 2024, online). A COP das Baixadas criada em 2023, “é um movimento de incidência com ações de educação climática, atividades culturais, de lazer e esporte nas comunidades” (COP DAS BAIXADAS, 2024, online), e que tem como missão “Fortalecer as narrativas em defesa da Amazônia, de justiça climática e social para os territórios e a população […]” (id.).

É interessante reparar que, no meio de todo esse caos, o Brasil está à frente de muitos países quando se trata de ‘refugiados climáticos’; em 2022 por exemplo o Brasil concedeu um tipo de visto humanitário para haitianos se refugiarem no país devido a desastres naturais que aconteceram no Haiti. Além disso, é notório a movimentação de pessoas do meio político a respeito das mudanças climáticas, principalmente depois das ocorrências de inundações que está acontecendo no Rio Grande do Sul, propondo projetos de lei como o PL das Cidades Resilientes que estabelece que toda cidade tenha medidas integradas de adaptação às mudanças climáticas criada ano passado e o mais recente PL que foca na criação de uma política nacional para refugiados climáticos ambos criados pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP).

REFERÊNCIAS

ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS (ACNUR). Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados. 01 jan. 1951. Disponível em: https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf. Acesso em: 20 jun. 2024.

______. Protocolo de 1967 relativo ao Estatuto dos Refugiados. 31 jan. 1967. Disponível em: https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Protocolo_de_1967_Relativo_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf. Acesso em: 20 jun. 2024.

BARBOSA, Júlia. Quem são os Refugiados Ambientais? A urgência do reconhecimento do refúgio por motivações ambientais e climáticas. CSVM/UFG. Disponível em: https://csvm.ufg.br/n/140699-quem-sao-os-refugiados-ambientais#:~:text=Apesar%20de%20ainda%20n%C3%A3o%20reconhecido,ONU%20para%20o%20Meio%20Ambiente. Acesso em: 20 jun. 2024.

Conferência Brasileira de Mudança do Clima (CBMC). Qual é o contexto atual da CBMC? CBMC. 2024. Disponível em: https://www.climabrasil.org.br/contexto.

COP DAS BAIXADAS. SOBRE O QUE É A COP DAS BAIXADAS. Disponível em: https://copdasbaixadas.org/.

DANIELE, Anna Luisa Walter de Santana; PAMPLONA, Danielle Anne. O reconhecimento dos refugiados ambientais no âmbito do Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos. Direitos Fundamentais & Justiça. Belo Horizonte, n. 37, p. 219-240, 2017. Disponível em: https://dfj.emnuvens.com.br/dfj/article/download/129/55/338.

GOUVEIA, Aline. Erika Hilton propõe criação de Política Nacional para Refugiados Climáticos. Correio Braziliense. 29 maio 2024. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2024/05/6853883-erika-hilton-propoe-criacao-de-politica-para-refugiados-climaticos.html.

PROGRAMA DE LAS NACIONES UNIDAS PARA EL DESARROLLO (PNUD). Informe sobre desarrollo humano 1994. In: Informe sobre desarrollo humano 1994. México: Fondo de Cultura Económica, S. A. de C. V. p. 243-243, 1994.

PSOL NA CÂMARA. Câmara aprova projeto de Erika Hilton que inclui exigência de adaptação às mudanças climáticas no Estatuto das Cidades. PSOL NA CÂMARA. 22 nov. 2023. Disponível em: https://psolnacamara.org.br/camara-aprova-projeto-de-erika-hilton-de-adaptacao-as-mudancas-climaticas/.