Matheus Santos de Souza- acadêmico do 5° semestre de Relações Internacionais da Unama

As relações históricas entre Israel e o Irã, marcadas por períodos de cooperação e desconfiança, sofreram uma transformação drástica em 1979 com a ascensão da Revolução Islâmica no Irã. Anteriormente aliados, os dois países viram-se em lados opostos do espectro político e ideológico. Enquanto o Irã monárquico dos xás da dinastia Pahlavi mantinha laços cordiais com Israel, a chegada do regime dos aiatolás de Ruhollah Khomeini inaugurou uma era de hostilidade e antagonismo. A aversão ao imperialismo estadunidense e a Israel tornou-se uma pedra angular da nova república islâmica, refletindo não apenas a mudança de regime, mas também uma redefinição das prioridades geopolíticas do Irã. Além disso, o Irã abandonou sua posição anterior e começou a apoiar ativamente a causa palestina, tomando medidas como o rompimento das relações com Israel e a cessão da embaixada israelense em Teerã para a Organização para a Libertação da Palestina (OLP). Enquanto isso, Israel, anteriormente acolhido como um aliado estratégico, começou a perceber o Irã como uma ameaça crescente à sua segurança e existência. Esta metamorfose nas relações entre os dois países não só moldou o panorama político do Oriente Médio, mas também desencadeou uma rivalidade que transcendeu as palavras, culminando em tensões e confrontos de longo prazo (BBC, 2024).

As tensões entre Irã e Israel têm sido marcadas por uma série de confrontos nas sombras, onde ambos os lados são acusados de realizar ataques contra os interesses um do outro, muitas vezes negando publicamente qualquer envolvimento. Essa “guerra nas sombras” se tornou cada vez mais pública à medida que as hostilidades se intensificaram ao longo do tempo. O programa nuclear do Irã tem sido um ponto central desses embates, com Israel, suspeito de possuir armas nucleares, declarando sua determinação em impedir que o Irã desenvolva uma bomba nuclear. Esses confrontos não se limitam apenas a instalações nucleares, mas também incluem ataques contra alvos pessoais, como cientistas nucleares de alto perfil. Por outro lado, o Irã é acusado de realizar ataques a interesses israelenses, gerando um ciclo de retaliações e escaladas de tensões entre as duas nações (ALJAZEERA, 2024).

No início de abril deste ano, aeronaves militares de Israel lançaram um ataque no consulado iraniano em Damasco, na Síria. Esse evento faz parte de uma série de investidas israelenses em território sírio desde o começo da guerra em Gaza, em outubro passado. Os alvos desses ataques incluem armazéns, comboios e aeroportos, com o propósito declarado de prejudicar a cadeia de suprimentos transnacional do Irã para o Hezbollah no Líbano. 

O pronunciamento do líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, na última quarta-feira, dia 10, ressaltou a crescente tensão entre o Irã e Israel. Khamenei enfatizou a necessidade de responsabilizar Israel pelo ataque ao complexo da embaixada iraniana na Síria, equiparando-o a uma agressão ao território iraniano. Ele argumentou que o “Regime maligno cometeu um erro e deve ser punido e será” (REUTERS, 2024). Em resposta, o Ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, afirmou que Israel reagirá caso o Irã ataque a partir de seu próprio território.

As tensões em curso entre o Irã, membro da OPEP, e Israel estão renovando os temores de um potencial conflito no Oriente Médio, o que poderia resultar em uma diminuição do fornecimento de petróleo. Essas tensões têm implicações globais significativas, não apenas em relação à estabilidade regional no Oriente Médio, mas também para os mercados de energia em todo o mundo e as dinâmicas das relações internacionais.

O aumento das hostilidades entre Israel e Irã não só ameaça a estabilidade da região, mas também tem o potencial de afetar os preços do petróleo e, por consequência, a economia global. Os preços do petróleo têm experimentado um notável aumento ao longo deste ano, com três meses consecutivos de ganhos significativos. O petróleo dos EUA registrou um aumento de quase 21%, enquanto o Brent subiu 18%. Essa ascensão é atribuída principalmente às crescentes tensões geopolíticas tanto no Oriente Médio quanto na Europa Oriental, além de um mercado global de petróleo mais restrito (CNBC, 2024). Além disso, a rivalidade entre esses dois países pode gerar uma polarização adicional na comunidade internacional, resultando em alianças geopolíticas complexas e, possivelmente, perigosas.

O pensamento de Hans Morgenthau em ‘A Política entre as Nações’ oferece uma lente interessante para compreender o aumento das tensões entre Israel e Irã. Morgenthau argumenta que a ameaça de guerra nuclear torna-se plausível quando as nações agem de forma irracional, um conceito que pode ser aplicado ao cenário atual. “Somente quando se supõe que as nações interessadas podem agir de modo irracional, destruindo-se mutuamente em uma guerra de escala total, é que a ameaça de guerra nuclear passa a ser plausível.”(MORGENTHAU, 2003, pág. 53). Para Morgenthau, a paz mundial somente seria possível por meio do equilíbrio de poder, as tensões entre Israel e Irã têm o potencial de gerar uma polarização adicional na arena internacional, ambiente onde o exercício moderado de poder é peça fundamental para entender a força política das Nações. Sem isso, países tomam partido e formam alianças complexas, aumentando assim a volatilidade geopolítica, representando um desafio para a cooperação multilateral na resolução de conflitos e promoção da paz e segurança global.

REFERÊNCIAS:

OLMO, Guillermo D. Qual a origem da rivalidade entre Israel e Irã e como ela está sendo intensificada pela guerra em Gaza. BBC News Brasil. Publicado em 8 de abril, 2024.

MORGENTHAU, Hans J. Política entre Nações: A Luta pelo Poder e pela Paz. Tradução de Oswaldo Biato. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2003.

MOTAMEDI, Maziar. Iran and Israel: From allies to archenemies, how did they get here?. Al Jazeera. Publicado em 6 de novembro de 2023.

Iran says Israel bombs its embassy in Syria, kills commanders. Reuters. Publicado em 2 de abril de 2024.

REGAN, Helen; ALKHSHALI, Hamdi;  QIBLAWL, Tamara. Iran vows revenge as it accuses Israel of deadly airstrike on Syria consulate in deepening Middle East crisis. CNN. Publicado em 2 de abril de 2024.

SANICOLA, Laura. Oil settles higher after Israeli strike overshadows ceasefire talks. Reuters. Publicado em 10 de abril de 2024.

Khamenei says Israel ‘must be punished’ for Syria embassy attack. Reuters. Publicado em 10 de abril de 2024.

NAPOLI, Eric. Possível entrada do Irã na guerra em Israel faria o petróleo disparar. Poder 360. Publicado em 12 de outubro de 2023.

KIMBALL, Spencer. U.S. crude oil breaks $86 as tensions mount between Israel and Iran. CNBC. Publicado em 4 de abril de 2024.