
Recentemente, o Tribunal Penal Internacional (TPI) ou comumente conhecido como Tribunal de Haia, que foi estabelecido objetivando julgar aqueles que tenham cometido crimes previstos no Estatuto de Roma, vale realçar, crimes de genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra, emitiu um mandado de prisão contra o Presidente russo, Vladimir Putin, alegando que ele tem responsabilidade criminal diante da identificação de deportação forçada de, aproximadamente, 16.000 crianças ucranianas para a Rússia ou áreas controladas pelo país, segundo a agência de notícias, BBC Brasil (2023). Porém, embora signifique certo avanço para a resolução deste conflito, essa medida pode não mudar o seu rumo.
Ainda que o TPI com seu “conjunto de arranjos de governança” que compreende seus artifícios de normas, regras e ou procedimentos para tentar regular a conduta dos atores (KEOHANE E NYE, 1997) se utilize dessa decisão como oportunidade para sinalizar aos servidores russos, sejam militares ou civis, para que andem na linha uma vez que se tornam sucessíveis aos processos do Tribunal ao mesmo tempo em que suas viagens internacionais tornam-se restritas, como forma de tentar provar a sua legitimidade diante das pressões da comunidade internacional.
O ato torna-se dificultoso dentro da Rússia, pois o país não ratificou a sua permanência no Tratado de Roma, não extradita seus cidadãos e muito menos reconhece a jurisdição do Tribunal de Haia, e, para que o julgamento ocorra, o réu deve estar fisicamente presente, seja na sua matriz, Holanda ou em algum dos países signatários, sob a custódia do TPI. No entanto, os fatos não determinam a anulação das possibilidades da prisão do líder russo, mesmo que isso resulte em um longo tempo de espera.
A comunidade internacional espera que durante algum foro exterior, como a sua provável visita à África do Sul – que é signatária do Estatuto de Roma –, para a Cúpula dos BRICS em 2023, seu mandado de prisão seja determinado. Porém, como anteriormente mencionado, mesmo com chances de acontecer, são baixas as estimativas, uma vez que os Estados podem se autopreservar e não causar um possível mal-estar entre nações quanto a uma possível operação global para prender Vladimir Putin, resultando em implicações diplomáticas.
Para além disso, o jogo de interesses políticos coloca a legitimidade do Tribunal de Haia em cheque, visto que tem forte peso nas suas decisões, principalmente quando se analisa a sua atuação contrária a países específicos, como a maioria dos indiciados sendo de países africanos desde o seu início, em 2002 (O GLOBO, 2023), ou a sua não intervenção nos conflitos armados da Síria, Iêmen ou outros países do Oriente Médio que até os dias de hoje sofrem de crimes contra a humanidade e crimes de guerra, evidenciando a fragilidade da ação do Tribunal Internacional Penal. Ao mesmo tempo em que figuras internacionalmente conhecidas como o ex-presidente norte americano George Bush ou mesmo o atual presidente dos EUA, Joe Biden, não são indiciados pelos crimes previstos no Estatuto, mesmo que os EUA, assim como a Rússia, não tenha ratificado o Tratado de Roma.
Thomas Hobbes exprime que quando dois homens almejam o mesmo, nesse caso, os Estados, o conflito se torna eminente (LEVIATÃ, 2018). Seguindo essa linha de raciocínio, o equilíbrio de poder competitivo, proposto por Hans Morgenthau (2003, p. 384), dessas nações na busca incessante por poder em relação ao território ucraniano, estabelece um cenário propício a incertezas, onde principalmente a disseminação da violência recai sobre os seus respectivos cidadãos enquanto perdurar o conflito.
Hodiernamente, observando tal cenário geopolítico e geoestratégico, é nítido que o fim da Guerra Fria não estabeleceu, de fato, o desfecho dos interesses das grandes nações, sobre a região do Heartland eurasiano, como desenvolve Harold John Mackinder em sua teoria do Poder Terrestre.
Referências
AGÊNCIAS INTERNACIONAIS, Por O Globo. Por que colocar Putin atrás das grades será missão (quase) impossível para o TPI. 2023. Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/03/entenda-por-que-colocar-putin-atras-das-grades-sera-missao-quase-impossivel-para-o-tpi.ghtml. Acesso em: 04 de abril de 2023.
BBC NEWS BRASIL. Por que Tribunal de Haia pediu a prisão de Putin?. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cpr59ez03z0o Acesso em: 02 de abril de 2023.
HOBBES, Thomas. O Leviatã. Blue Editora, 2018.
HUMANS RIGHTS WATCH. Ukraine: International Justice Response. 2023. Disponivel em: https://www.hrw.org/news/2023/03/29/ukraine-international-justice-response. Acesso em: 05 de abril de 2023.
KEOHANE, Robert; NYE, Joseph. Power and Independence. Boston. Little, Brown and Company, 1977.
MACKINDER, Harold J. Geographical Pivot of History. USA. Cosimo Classics, 2020.
MORGENTHAU, Hans J. A Política entre Nações: A luta pelo poder e pela paz. São Paulo. Editora Universidade de Brasília, 2003. ROSETTI, Victor. Tribunal Penal Internacional: o que é e como atua?. POLITIZE!, 2019. Disponível em: https://www.politize.com.br/tribunal-penal-internacional/. Acesso em: 02 de abril de 2023.