Tiago Callejon Santos – acadêmico do 7° semestre de Relações Internacionais da Unama

Desde que se compreende ou se estuda as relações do homem ao meio o qual está inserido ou às suas relações mediante aos outros homens, é de conhecimento comum que o fenômeno da guerra sempre esteve presente, de maneira intrínseca, à própria natureza do homem. A guerra pode ser compreendida como um fenômeno de natureza social “que se caracteriza pelo choque violento entre vontades coletivas conflitantes, dispostas a empregar todos os meios, recursos e capacidades que lhe estejam disponíveis para submeter, debelar ou transformar a vontade oponente e, assim, satisfazer a sua própria” (CLAUSEWITZ apud MOTA e AZEVEDO, 2019). Trata-se, portanto, de um objeto de parâmetro comportamental e social no qual os homens submetem os seus interesses e seus ânseios mediante aos outros através do uso da força e da violência, subjulgando os adversários à sua própria vontade, conforme afirmado pelo autor prussiano Clausewitz.

Como já destacado, a guerra é um fator presente na constituição humana desde os seus primórdios e, durante a consumação do tempo, houve vários teóricos que tentaram esclarecer sobre a guerra, sua natureza e seus efeitos, tais como, por exemplo, Sun Tzu, filósofo e estrategista chinês, na Arte da Guerra, e Tucídedes, filósofo clássico-grego das Relações Internacionais, na Guerra do Peloponeso. Contudo, estes teóricos não abordam unicamente a guerra por si mesmo, mas, também exploram os vários dimensionamentos que as guerras proporcionam às relações humanas e às relações de poder, como a questão da espionagem.

Tratando-se exclusivamente de Sun Tzu, o teórico expõe, no capítulo XIII da Arte da Guerra, que a espionagem seria uma estratégia de obtenção de conhecimento do inimigo e que essa ferramenta se comportaria como um eficaz serviço no que concerne à previsão de poder saber a movimentação do seu inimigo. Logo, o seu efeito imediato seria de conceder uma vantagem comparativa em relação ao seu inimigo no momento que se obtêm essa vantagem de conhecimento. 

Outrossim, na contemporaneidade, a espionagem é definida, segundo a Agência Brasileira de Inteligência, como sendo a ação realizada por um ente qualquer na busca de obtenção de informações sigilosas de um Estado soberano – neste caso, o Brasil – a fim de beneficiar organizações, intituições ou Estados adversos com informações sigilosas do país, desencadeando processos de vulnerabilidade às estruturas próprias da nação (ABIN, 2020).

Tendo isto em mente, é necessário compreender que a espionagem se comporta, portanto, como um objeto de manutenção dos Estados em fomentar novas guerras ou conflitos de variadas ordens a fim de obter relativos ganhos nestas relações, seja ganhos materiais de obtenção de recursos ou territórios, ou ganhos imateriais, como influência geopolítica e social. De fato, pode-se observar essa realidade quando se constata, por exemplo, que nos últimos 20 anos, após os ataques ao 11 de Setembro, os EUA focaram suas ações de espionagem na região do Oriente Médio sob a perspectiva de combater eventuais ataques terroristas que poderiam se originar na região. Porém, a partir de 2021, os Estados Unidos se atentam a focar às movimentações de espionagem à Rússia e à China, nas regiões de influência destes países na África, com o temor de perder a sua influência geopolítica e econômica nestas regiões (Lillis, 2021).

Outrossim, no Oriente Médio, compreende-se definitivamente como a espionagem se efetua como um instrumento fulcral às relações de política externa na região, sobretudo nas relações de Israel com os países da Liga Árabe, principalmente o Irã. O Serviço Secreto de Inteligência de Israel, o Mossad, configura-se como o serviço de inteligência mais eficaz do mundo, o qual é visto por certos analistas políticos como o mais temido do mundo, e os seus esforços nesta área de atuação são tão visíveis que em um de seus episódios mais polêmicos de ação sigilosa, o Mossad foi acusado de empregar uma espiã israelense de assassinar Mahmoud al-Mabhouh, na época, o maior traficante de armas do Oriente Médio, o qual encontrava-se em Dubai a fim de negociar a compra de mísseis iranianos do grupo terrorista Hamas, donde essa sucessão de eventos desencandeou em conturbadas relações conflituosas e políticas de Israel à Liga Árabe (Szklarz, 2019).

Além disso, também se observa os esforços de Israel e da Mossad em frear o desenvolvimento do projeto nuclear iraniano, no Teerã, aonde no período de 2010 a 2012, a Mossad foi acusada de assassinar 5 engenheiros nucleares (COHEN, 2020). No entanto, o clímax dessas relações de espionagem na formação de novos conflitos do Oriente Médio se desencadeou com a morte de Mohsen Fakhrizadeh, o principal cientista nuclear do Irã, na qual Israel foi acusada mais uma vez de assasinar os engenheiros nucleares do Irã, porém dessa vez sem resposta direta do governo de Israel acerca do assunto (COHEN, 2020). Esses são exemplos relativos e mínimos de como a espionagem é, hoje, um instrumento operacional dos Estados soberanos em aplicar os seus interesses internos à geopolítica nas regiões que lhe interessam operacionar e, portanto, observa-se como a espionagem difinitivamente se configura como uma ferramenta de formação de novos conflitos, na contemporaneidade, o qual se reverberam em variadas ordens e naturezas nas matérias de conhecimento internacional, como a política, o aspecto cultural, a economia e o militarismo.

REFERÊNCIAS

TZU, Sun. A Arte da Guerra, Cultura Brasil, 1° Edição – 2010, 58 páginas. Disponível em: https://www.baixelivros.com.br/literatura-estrangeira/a-arte-da-guerra

MONTALVÃO, Marcelo Carvalho de. Sun Tzu, o Pai da Espionagem, Montax Brasil, 2015. Disponível em: https://montaxbrasil.com.br/2015/03/05/sun-tzu-pai-da-espionagem/

MOTA, Rui Martins de. AZEVEDO, Carlos E. Franco. A Guerra Omnidimensional: novas concepções do pensamento estratégico militar. Defesanet, Brasília, Brasil, 2019. Disponível em: https://www.defesanet.com.br/doutrina/noticia/34136/A-Guerra-Omnidimensional–novas-concepcoes-do-pensamento-estrategico-militar/#:~:text=A%20guerra%20%C3%A9%20um%20fen%C3%B4meno,assim%2C%20satisfazer%20a%20sua%20pr%C3%B3pria.

Espionagem, Agência Brasileira de Espionagem, Gov.br. Brasil, 2020. Disponível em: https://www.gov.br/abin/pt-br/assuntos/fontes-de-ameacas/espionagem

GOMES, Pedro Henrique Miranda. ALVES, Vágner Camilo. Clausewitz, a Ciberguerra e a Guerra Russo-Georgiana. Rev. Carta Inter, Belo Horizonte, v.15, n.3, pág. 232-254, 2020, Brasil. Disponível em: https://www.cartainternacional.abri.org.br/Carta/article/view/1065/812

LILLIS, Katie Bo. Espionagem dos EUA abandona o Oriente Médio e passa a mirar Rússia e China. CNN Brasil, 2021. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/espionagem-dos-eua-abandona-o-oriente-medio-e-passa-a-mirar-russia-e-china/

SZKLARZ, Eduardo. MOSSAD: A EFICIÊNCIA IMPLACÁVEL DO SERVIÇO SECRETO ISRAELENSE. Aventuras na História, Brasil, 2019. Disponível em: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/mossad-a-eficiencia-implacavel-do-servico-secreto.phtml

COHEN, Sandra. Por que o assassinato do principal cientista nuclear iraniano é atribuído a Israel? G1, Brasil, 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/blog/sandra-cohen/post/2020/12/01/por-que-o-assassinato-do-principal-cientista-nuclear-iraniano-e-atribuido-a-israel.ghtml