Lorena Carneiro – acadêmica de Relações Internacionais da Unama

No dia 15 de novembro é celebrada, no Brasil, a Proclamação da República, data que marca o rompimento com o regime monárquico instaurado no país desde a sua independência de Portugal, em 1822. A monarquia estabelecida no Brasil teve nuances muito particulares quando comparada com as outras existentes no mundo. Mesmo com o grito de liberdade dado por Dom Pedro I, os laços de poder entre Brasil-Lisboa não foram cortados. Pode-se afirmar que a coroa portuguesa foi conservada (BIGNOTTO,2020) e transformou o Brasil em uma extensão de sua influência global. 

Etimologicamente, proclamação refere-se a uma declaração pública e solene, o que leva a se pensar que a instauração da forma republicana de governo no Brasil não passou de mera formalidade, pois, no movimento não houve uma grande movimentação popular para tal mudança no país. Aristides Lobo (CARVALHO,1987) afirmou “o povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava”. A proclamação foi um movimento interno do alto escalão estatal, ou seja, foi um golpe (talvez o primeiro oficialmente registrado como tal).

O movimento republicano tem início no Brasil em 1870, quando o Partido Liberal publica o “Manifesto Republicano”, que traz como primeira linha ideológica o lema “somos América e queremos ser americanos”, fazendo uma crítica direta ao modelo monárquico europeu, não fazendo sentido um país americano ser governado por um monarca português. Por algum tempo, essa ideia ficou restrita aos mais radicais integrantes do Partido, que também desejavam o fim da escravidão, uma reforma política e o estabelecimento de um sistema de ensino universal no país, que estava socialmente estagnado. Em 1873, surge o Partido Republicano Paulista – PRP, que já apresentava ideias federalistas, pois queriam mais autonomia para as províncias, dado o protagonismo econômico que a região apresentava à época. As duas linhas de pensamento já mostram as divergências entre os republicanos. 

Dentro desse cenário é importante ressaltar o prestígio que Dom Pedro II tinha perante a sociedade. O ideal imaginado pelos republicanos era a espera da morte do imperador para poder se dar início ao processo de transição. Mas alguns fatos serviram de catalisadores para o fortalecimento da ideia e a tomada de decisões. 

Dentre os fatores que contribuíram para a queda da monarquia está a Guerra do Paraguai. A vitória brasileira custou caro, fazendo com que a dívida externa, os juros e a inflação aumentassem consideravelmente, o que prejudicou a economia. Outro fato importante foi a participação de negros no conflito, que corroborou com a causa abolicionista, cada vez mais forte, pressionando o governo para decretar o fim da escravidão. O exército, vitorioso na guerra, ganhou prestígio na sociedade, porém não com a monarquia, que passou a censurar algumas de suas insatisfações. Esse mal-estar gerou a “questão militar”, uma das causas da perda da governabilidade monárquica.

Restava ao imperador o apoio dos conservadores, porém estes se distanciaram da coroa em dois momentos: o primeiro, em 1870, com a chamada “questão religiosa”, quando o governo brasileiro entra em conflito com a Igreja Católica, por conta de uma ordem papal, que expulsava todos os maçons da instituição, o que desagradou o imperador e o segundo veio com a assinatura da Lei Áurea, pela princesa Isabel, em 13 de maio de 1888, decretando a abolição dos escravidão sem o pagamento de indenização aos senhores proprietários de escravos, gerando grande insatisfação com o governo.

Os líderes republicanos buscaram um nome imponente dentro da esfera militar para conduzir o movimento. Chegaram ao nome de Marechal Deodoro da Fonseca. Porém, ele era amigo íntimo do imperador, o que lhe causou imenso desconforto com o todo o contexto que lhe fora apresentado. Após inúmeras conversas, especialmente com Benjamin Constant, principal militar líder dos republicanos e expoente da corrente positivista no Brasil, Deodoro da Fonseca concordou em colocar o golpe em ação. Uma marcha com centenas de homens, na tarde de 15 de novembro de 1889, anuncia a nova forma de governar no Brasil. 

No dia seguinte ao golpe, os jornais comunicavam ao povo a transição e no dia 17 de novembro, a família real partiu para o exílio em Lisboa, Portugal. Não houve nesse período resistência para se evitar a instauração da república. Tal pacificidade foi um pedido do próprio imperador.

A implementação da república no Brasil foi o primeiro passo para a uma nova realidade política no país. Importante ressaltar que república não necessariamente implica em democracia. A ideia da coisa pública (res publica) é muito mais genérica quando comparada a democracia (demos kracia). O aperfeiçoamento das duas ideias segue até os dias atuais, sendo a vigilância da sociedade a principal arma contra qualquer atentado à sua ordem, especialmente em países como o Brasil, tão marcado por tentativas (algumas consolidadas) de golpe. 

REFERÊNCIAS:

BIGNOTTO, Newton. O Brasil à procura da democracia: da Proclamação da República ao século XXI (1889-2018). Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.

CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.