
Rayana Fachinetti – Acadêmica do 6º semestre de RI
A questão “Governo Bolsonaro” é uma dinâmica difícil de ser analisada, pois possui camadas em questões históricas e culturais. O Brasil é um dos líderes da América Latina em viés econômico, mas se distingue em perspectiva de pertencimento cultural. Exemplo disso é a falta de integração econômica, travada em termos como MERCOSUL e UNASUL, que não se desenvolvem, pois (além de outros fatores) não há uma aproximação de valores, interesses e ideias entre os membros pertencentes a esses blocos, dificultando o alinhamento.
Nessa política de extrema-direita vigente, tal dificuldade se desenvolve exponencialmente, resultando em uma quebra na credibilidade, gerando insegurança nas políticas externas do país. Além do econômico, há o acirramento do viés anti-migratório incentivado pelo presidente, principalmente entre países vizinhos como a Venezuela, que é apontada como uma forma de “ameaça comunista” (ideia propagada durante a Guerra Fria, que se perpetua em falas de políticos de viés liberal) pelo mesmo.
A política externa brasileira durante o governo de Bolsonaro se apresenta como uma política de exclusão dos vizinhos sul-americanos e possui uma quebra na integração sul-sul de governos anteriores, erroneamente interpretados como política pública de governo (passageira e alinhada aos interesses dos representantes) e não de Estado (institucionalizada como interesse do país).
Segundo Karen Pozo e Marcelino Lisboa (2021), a Política Pública “é uma atividade oficial dos governos que (..) passa por uma série de etapas”, ou seja, um conjunto de comportamentos do governo (atrelados ao Estado) que impactam na vida pública. Política Externa, segundo os autores, é composta por “uma variedade de áreas e domínios que formam um conjunto de preocupações dos tomadores de decisão, atrelados a outros interesses” (Breuning, 2007, apud POZO e LISBOA, 2021), considerando sempre o fator transnacional e decisório. Assim, pode-se afirmar que uma política externa não se enquadra em uma política de governo e sim de Estado (institucionalizada na Constituição), porém que se encaixa em uma política pública por impactar nacionalmente e pelos seus procedimentos domésticos.
Além disso, essas relações de exclusão do governo contrariam fortemente a Constituição Federal brasileira em questão de princípios que regem as relações internacionais, principalmente o inciso IX do artigo 4° dos princípios fundamentais, que explicitamente afirma que deve haver “cooperação entre os povos para o progresso da humanidade” e o Parágrafo Único que afirma que “ A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações” (BRASIL, 1988). Isto é, a política pública do governo atua contrariamente com as regras do Estado, impactando principalmente âmbitos econômicos e sociais nacionais. Além do mais, é possível dizer que um governante deve governar a partir dos interesses do Estado e da Nação e não de seus próprios (Maquiavel, 1532, apud Morgenthau 1948), o que mostra uma dicotomia na política brasileira.
Outrossim, a visão anti-migratória de Bolsonaro pode ser alinhada ao sentido centro-periferia de autores Cepalistas (Souza, s.d), que visam firmar uma ideia de que o centro se desenvolve em questões econômicas e ideológicas (em um ponto de vista superior) e a periferia se estabelece em “atraso” nesses pontos, atrelando o Brasil com os moldes do centro (por ser uma potência econômica na América Latina) e a Venezuela, dada erroneamente como comunista, seria a periferia, que quebraria os conceitos implantados e “destruiria o Brasil”.
Nesse sentido, Bolsonaro não se enquadra em um governante que sabe gerir uma política que visa o benefício das relações externas, que ao propagar e perpetuar ideologias ocidentais intrinsecamente implantadas na sociedade, tende ao colapso governamental. A dicotomia na política brasileira corrobora na insegurança externa para com o Estado, impactando em âmbitos econômicos e sociais do país.
Referências:
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
LISBOA, Marcelino, POZO, Karen. Política Externa, Relações Internacionais e Políticas Públicas: Uma discussão conceitual. Revista Brasileira de Políticas Públicas e Internacionais (RPPI). 2021.
SOUZA, Nali de Jesus de. UMA INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO. s.d.