Camilly Alves Freire de Sá – acadêmica do 2º semestre de Relações Internacionais da Unama.

No período Pós-Primeira Guerra Mundial, instaurou-se na Itália, um cenário de intenso desequilíbrio econômico, sobretudo, por conta da crise nas indústrias italianas após os conflitos da guerra e, consequentemente, pelo desemprego estrutural, visto que milhares de soldados que voltaram da guerra, não encontraram empregos para que pudessem sobreviver. Não bastasse isso, para além da crise econômica, havia grande descontentamento social, pois ao final da guerra, os anseios territorialistas e imperialistas italianos não foram atendidos e, uma vez que a Itália pagou um alto preço em vidas humanas pela vitória da Tríplice Entente, manifestou-se um sentimento de grande frustração na sociedade italiana. Ademais, um dos principais aspectos do período foi o fortalecimento do regime socialista com o advento da Revolução Russa em 1917, que transformou a Rússia na primeira nação socialista da história e conquistou o apoio de diversos adeptos ao socialismo no continente europeu, reverberando também na Itália e conquistando, de forma exponencial, cargos de autoridade no regime político parlamentar italiano (PARIS, 2006).

Diante desse cenário, aproveitando-se desse quadro crônico de crise social e política em desdobramento e, acima de tudo, da ansiedade e do medo da “ameaça comunista que estabeleceu-se em uma significativa parcela da população, Benito Mussolini – futuro líder do Partido Nacional Facista – projetou o avanço do fascismo na Itália. Pautado no emprego da violência, na defesa da propriedade privada, em uma política externa nacionalista e a realização de obras públicas para fomentar a economia rural e, elegendo o esquerdismo e o socialismo como fontes de todas as mazelas da Itália, o fascismo foi apoiado majoritariamente por grupos liberais, com grande aproximação aos proprietários de terras nas zonas rurais, elitistas e à classe média urbana. Nesse contexto, torna-se necessário reconhecer a Marcha sobre Roma – grande movimento de fascistas em direção a Roma – como evento que levou à ascensão do fascismo ao poder da Itália, haja vista que posteriormente à marcha, Mussolini foi nomeado como primeiro-ministro do país, em 30 de outubro de 1922. Após assumir o poder, o ditador implantou um regime totalitário altamente repressivo,controlando o país de maneira extremamente autoritária e extinguindo os partidos políticos, as eleições e as liberdades individuais e de imprensa, além de propagar intensa perseguição aos opositores. Por fim, o declínio da Itália na Segunda Guerra Mundial ocasionou não só a demissão de Mussolini, como também a sua prisão e, no ano de 1945, o líder fascista foi executado por um pelotão de fuzilamento. (SASSOON, 2009)

Mesmo após praticamente um século da queda de Benito Mussolini, as raízes do fascismo ainda são perpetuadas na Itália, prova disso é a vitória de Giorgia Meloni nas eleições que ocorreram no mês de setembro, em 2022. Liderando o partido de extrema-direita “Irmãos da Itália”, a primeira mulher a assumir o cargo de primeira-ministra é francamente admiradora das políticas ditatoriais de Mussolini, adota um caráter ultranacionalista, autoritário, xenófobo e anti-imigratório, isto é, claramente neofascista. É válido ressaltar que, novamente, a ultradireita aproveitou-se de um momento de instabilidade política italiana para ascender ao poder, já que Giorgia foi eleita após a renúncia de Mário Draghi – banqueiro do Banco Mundial que tocou um governo com apoio de praticamente todos os partidos do Parlamento, da esquerda à direita, porém sofreu um desgaste provocado pela inflação, a guerra e as restrições durante a pandemia, levando-o à renúncia – e dessa forma, as eleições que aconteceriam somente em 2023, foram antecipadas. (Terapia Política, 2022)

Partindo dessa perspectiva, é essencial reconhecer apreensão do sistema internacional, sobretudo do bloco europeu, acerca da vitória de Giorgia, pois seu partido assume um perfil fortemente eurocético e, de acordo com o raciocínio do professor Luciano Cheles, o que realmente preocupa a União Europeia é a possibilidade de que a Itália, país fundador do bloco e sua terceira maior economia, torne-se outra Hungria ou Polônia, colocando em risco seus valores fundamentais (BBC, 2022). Outrossim, será mais difícil ver a Itália ao lado de seus tradicionais aliados europeus, visto que Meloni se opõe abertamente à imigração e já ameaçou o bloqueio naval de países do Norte da África para impedir a chegada de barcos de refugiados (G1, 2022). Além disso, a primeira-ministra eleita e seu partido em ascensão simbolizam imenso retrocesso por apresentar discursos de incompatibilidade com pautas de minorias sociais, especialmente em relação à comunidade LGBTQIA+, declarando ser contrária à adoção de crianças por casais homoafetivos.

REFERÊNCIAS :

COHEN, Sandra. O que representa um governo de extrema direita liderado por GiorgiaMeloni para a União Europeia?. G1, 2022. Disponível em:<https://g1.globo.com/mundo/blog/sandra-cohen/post/2022/09/26/o-que-representa-um-governo-de-extrema-direita-liderado-por-giorgia-meloni-para-a-uniao-europeia.ghtml&gt;.Acesso em: 01 de outubro de 2022.

ECO, Umberto. O fascismo eterno. Rio de Janeiro: Record, 2020.

GONÇALVES, Marcos. Mussolini e a ascensão do fascismo. Scielo Brazil, 2010.Disponível em: <https://www.scielo.br/j/his/a/QrrSyHQRm69t8Cmv7kncnHC/?lang=pt&gt;.Acesso em: 01 de outubro de 2022.

PARIS, Robert. As origens do fascismo. São Paulo: Perspectiva, 1993.

ROSAS, Paula. Giorgia Meloni: como neofascismo avança na Itália e pode impactar o restante da Europa. BBC News Brasil, 2022. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/geral-63079395&gt; . Acesso em: 03 de outubro de 2022.

SASSOON, Donald. Mussolini e a ascensão do fascismo. Rio de Janeiro: Agir, 2009.

SIMI, Gustavo. O neofascismo invade as eleições na Itália. Terapia Política, 2022.Disponível em: <https://terapiapolitica.com.br/o-neofascismo-invade-as-eleicoes-na-italia//&gt;. Acesso em: 02 de outubro de 2022.