Amanda Olegário – 2º semestre
Durante os anos de 1618 a 1648, o continente europeu sofreu uma das maiores guerras já enfrentadas, a chamada Guerra dos 30 Anos, considerada “pela historiografia europeia como um século de atraso e regressão, guerras e pestes, marcado por deflação, colapso monetário, queda de produção e população […]” (CARNEIRO, 2006, p. 163), que, por um lado, foi um conflito religioso o qual envolvia disputas entre os países católicos (Sacro Império Romano Germânico, Espanha e seus defensores) e protestantes (principados alemães, Holanda, Dinamarca, Suécia e a França católica) e por outro foi uma guerra civil alemã, uma vez que as regiões germânicas lutavam por autonomia e não mais queriam está subordinadas ao poder imperial.
Não demorou muito para o conflito alcançar todo o continente e “passaram a levar em conta outros interesses e causas, como a expansão de territórios e a busca por hegemonia política na região” (LEAL, 2018), como foi o caso da entrada da França na guerra, que se aliou aos protestantes para favorecer o interesse nacional francês a fim de anexar as regiões da Alsácia e da Lorena ao seu território e de enfraquecer a casa de Habsburgo da Áustria e a Espanha, principal inimigo dos Bourbon.
Com o término da guerra em 1648, é formada uma nova ordem internacional baseada no equilíbrio de poder e na formação e soberania dos Estados-nação a partir da assinatura dos Tratados de Vestfália; o autor Henrique Carneiro (2006) explica que tais tratados
são vistos como o marco na construção da ordem europeia moderna em que a “razão de Estado” sobrepõe-se aos princípios religiosos medievais da soberania do Papado, que haviam sido a base das grandes monarquias nacionais. (CARNEIRO, 2006, p. 163)
Ou seja, os assuntos e interesses estatais, antes definidos e geridos pela Igreja, agora passam a ser responsabilidade dos Estados baseados em preceitos seculares. Firmados todos os acordos (11 no total) nas cidades vestfalianas de Osnabrück e Münster (atual Alemanha), os Tratados de Vestfália marcam o fim da Guerra dos 30 Anos com a vitória do lado protestante, especialmente para os holandeses, suecos e alemães, representando a conquista das suas soberanias, tanto no âmbito político quanto econômico. Dessa forma, os Tratados de Vestfália definiram princípios como uso da diplomacia e evitar a guerra a todo custo, respeito à soberania dos Estados, não interferência nos assuntos internos dos Estados, respeito pelos compromissos internacionais (Pacta Sunt Servanda), dentre outros preceitos, fundados a partir do surgimento do direito internacional “pactos regulando relações internacionais, com livre navegação nos mares e a busca do não comprometimento do comércio e de civis na guerra” (CARNEIRO, 2006, p. 183).
É necessário salientar que os Tratados de Vestfália apenas formalizaram uma dinâmica sobre a autonomia dos principados que já existia e estava sendo construída de forma lenta e gradual, como esclarece o autor Felipe Kern Moreira (2012). Não significa que havia um sistema de Estados antes de 1648, podendo até ser considerada uma fala anacrônica, mas também não é possível afirmar que a partir desta data esse sistema tenha surgido de forma instantânea. Além disso, esses tratados também não foram sinônimos de paz nem de tolerância, uma vez que a Espanha e a França guerrearam até 1659, por exemplo, e isso tudo demonstra, a partir da pesquisa do autor, que “o modelo vestfaliano não é uma descrição cientificamente apurada do sistema de Estados” (MOREIRA, 2012, p. 5).
Apesar disso, essa visão mais crítica do autor Felipe Kern Moreira (2012) não diminui a importância desse marco histórico para os estudos das Relações Internacionais, visto que é referência em pesquisas relacionadas sobre o Estado e formou conceitos relevantes como noções de “soberania”, “equilíbrio de poder”, Estado-nação”, “razão de Estado”, “diplomacia”, dentre outros; e para sua época, foi um episódio transformador para a política moderna e contemporânea, pois não havia esse reconhecimento de um conjunto político de nações que afirmavam fazer parte de um sistema internacional regido por um direito internacional, e isso foi criado a partir desses tratados (CARNEIRO, 2006, p. 184).
Referências Bibliográficas
CARNEIRO, Henrique. Guerra dos Trinta Anos. In: História das Guerras / Demétrio Magnoli, org. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2006. p. 163 – 188.
CARVALHO, Bruno Leal Pastor de. A “Paz de Vestfália”: marco das relações internacionais (artigo). In: Café História – história feita com cliques. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/paz-de-vestfalia-marco. Publicado em: 29 jan. 2018. Acesso: 19/05/2022.
MOREIRA, Felipe Kern. Não fale da Paz de Vestfália! Meridiano 47. 2012, vol.13, n.129, pp.03-09. Disponível em: http://periodicos.unb.br/index.php/MED/article/view/4483/4088