Profa. Dra. Lygia Sousa

No ano de 2006, uma das edições do “The New York Times” dedicou uma longa matéria prevendo o uso da Internet como ferramenta fundamental para aproximar políticos e partidos dos seus potenciais eleitores. Segundo o texto, o uso das – até então – recentes TIC’s (Tecnologias da Informação e da Comunicação) tendiam a interferir em aspectos da política, tais como: na organização dos perfis políticos e das propagandas eleitorais, no tipo de interação que se firmaria entre candidato e a opinião pública, na maneira como os eleitores expressariam insatisfações e preferências e até mesmo na forma como as campanhas seriam financiadas. Especialistas consultados pelo jornal na época, previam um efeito avassalador das redes sociais nos pleitos dos anos seguintes. Lógico que a reflexão presente no artigo do conceituado jornal norte americano soou como novidade e foi reproduzido pela imprensa do mundo inteiro. Já na eleição para o cargo de Presidente da República dos Estados Unidos no ano de 2008, deu-se os primeiros sinais de como a Internet seria um dos lugares mais eficazes para a renovação do marketing político com o uso das listas de e-mails, blogs de políticos, websites de partidos, entre outros recursos que foram pouco a pouco se normalizando entre a sociedade e construindo uma comunicação mais próxima do público do que somente nos horários reduzidos na mídia tradicional.
Depois de dezesseis anos da profética publicação feita pelo The New York Times, é incontestável afirmar que a Internet, por ser causa e consequência da cibercultura, transformou o modo de ser e de viver na contemporaneidade. Agamber (2009) afirma que o contemporâneo é composto pelo passado em contato com o recente, da poeira do inexistente que resiste ao tempo e sobrevive no atual. Sendo assim, o sentido do que é política, democracia e mercado atualizam-se com o passar dos anos, contudo, sem perder os princípios que os constituíram no passado. Ainda com interesse de reafirmar essa tese, o filósofo Habermas (1980) afirmava a necessidade da democracia representativa, construída a partir de discussões sólidas com ampla participação popular, remetendo ao modelo experenciado por Sócrates na Ágora. No contexto da cibercultura, as redes funcionam como “Ágora Virtual”, onde todos os cidadãos com os seus corpos virtualizados se encontram no ciberespaço para deliberar a respeito de assuntos públicos. Os mais diversos assuntos, principalmente, aqueles que interferem diretamente nos direitos civis, políticos e sociais viram pauta de discussões nas redes sociais, fenômeno denominado por Ferreira (2019) de Cidadania Glocal.
Assim como no passado, a força da tomada de decisão estava na mão daqueles que detinham o poder econômico, como o clero e a nobreza, hoje, está sob aqueles que encontram-se à luz da visibilidade mediática. As celebridades que agregam inúmeros seguidores nas redes sociais, utilizando-se da antiga e ainda válida estratégia de marketing em que famosos agregam valor aos produtos devido apelo construído junto ao seu público segmentado. As principais redes sociais do momento, Instagram, Twitter e TikTok possuem métricas para avaliação e controle frequente do alcance das postagens e do “crescimento da comunidade”. Diante disso, não fica difícil de entender o motivo pelo qual o posicionamento político das celebridades é fundamental para o atual cenário político no Brasil e no mundo.
Contudo, além da reflexão mercadológica que permeia a posição política que beneficia ambas as partes, celebridade e candidato, existe também a pressão social, cada vez mais exacerbada por uma posição da classe artística sobre as questões políticas. Isso ocorre devido, historicamente, a arte ser uma expressão acima de tudo política. A arte medieval, renascentista, modernista sempre foram e ainda são expressões políticas de uma determinada época. Chico e Caetano são nomes ímpares de resistência durante o período da ditadura militar no Brasil. Logo, espera-se que diante do atual cenário brasileiro, os artistas/celebridades mais jovens cumpram o seu papel de demonstrar de que lado estão na polaridade instaurada nos últimos anos.
Anitta, Luiza Sonza, Pablo Vittar, Ludmilla ingressam a lista de nomes dos que possuem o maior número de seguidores nas redes e que declararam publicamente o apoio ao ex presidente Luis Inácio Lula da Silva. Ronaldinho Gaúcho, Gustavo Lima, Zezé di Camargo ocupam a lista dos que apoiam o atual presidente Jair Bolsonaro. As declarações feitas pelos artistas geram efeitos diversos na sociedade e isso se deve pelas diferenças de crença, valores e de percepções pessoais. O endosso é positivo, pois acaba chamando atenção daqueles eleitores que possivelmente tentam se esquivar da responsabilidade eleitoral ou que ainda estão em dúvida em quem escolher. Claro, em termos mercadológicos e políticos, o artista e o candidato saem ganhando, pois a imagem de ambos se fortalecem nesse apoio.

Referências Bibliográficas:
AGAMBER, Giorgio. O que é Contemporâneo? e outros ensaios. Argos. Chapecó, SC. 2009.

FERREIRA, Lygia. Imaginário, Cibercultura e Cidadania: a interferência do fenômeno glocal interativo na ressignificação da cidadania na contemporaneidade. Tese (Doutorado), Comunicação e Semiótica – PUC- SP, 2019. Disponível em https://tede2.pucsp.br/handle/handle/22182
HABERMAS, Jurgen. The Theory of communicative action. Vol 1. Reason and the rationalizalion of society. Beacon Press. Boston,1980.