Matheus Castanho Virgulino

7° semestre de Relações Internacionais

A Finlândia é um país conhecido por sua neutralidade, seu desenvolvimento econômico e sua integração com a comunidade internacional através de arbitragem e diplomacia. Mas nem sempre foi assim, a postura de neutralidade assim como a própria Finlândia tem um desenvolvimento relativamente recente se comparado aos outros Estados do continente Europeu.

A origem dos Finlandeses se encontra nos diversos povos Fino-Úgricos que migraram para a região hoje conhecida como Finlândia no leste da Escandinávia. Por boa parte de seu desenvolvimento histórico, viviam como povos seminômades em uma sociedade extremamente descentralizada em grupos familiares (Enander, 2022). A dominação da Finlândia por potências estrangeiras começou em 1323 quando a região foi anexada ao reino da Suécia, começando um processo de dominação estrangeira que permaneceria até o começo do século XX.

Os reinos Escandinavos não tinham tanto poder central quanto os da Europa ocidental, como consequência disso a Finlândia permaneceu uma sociedade relativamente descentralizada e isolada. Não obstante isso, a chegada de instituições Suecas e a religião Cristã começou um gradual processo de integração Finlandesa à cultura ocidental no continente Europeu (Zetterberg, 2017). O desenvolvimento de boa parte da cultura e personalidade Finlandesa pode ser encontrado nesse período de dominação Sueca.

Através de uma série de guerras, tais como a Grande Guerra do Norte no século XVIII e a guerra de 1809, a Suécia perdeu sua posição como potência no mar Báltico, dando lugar à titânica Rússia como principal império no norte da Europa. O czar Alexandre I concedeu grande autonomia à Finlândia sobre o formato de um Grão-Ducado, significando que estaria submetida à autoridade dos imperadores mas mantendo uma semi-independência para se autogovernar (Zetterberg, 2017). A Finlândia, portanto, foi pouco afetada pela conturbada situação interna Russa no século XIX. O final do século no entanto viu um endurecimento da postura Russa, ao buscarem um processo de Russificação e gradual eliminação da cultura Finlandesa. É nessa época que começa um aumento de movimentos pela independência por parte de intelectuais.

A primeira guerra mundial foi devastadora para a Rússia, a junção de incompetência militar e tensões sociais culminou no caos das revoluções de 1917 e a subsequente guerra civil. A Finlândia em igual maneira foi afetada pelo conflito, com um embate entre o exército branco republicano e o exército vermelho comunista. Diferente do que ocorreu na Rússia, na Finlândia foi o exército branco que venceu e não os comunistas, isso resultou no país criando uma República constituinte enquanto o resto dos territórios que antes faziam parte do império Russo formavam a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

O pacto Molotov-Ribbentrop de 1939 entre a URSS e a Alemanha Nazista incluía um protocolo secreto que delegava a Finlândia à esfera de influência soviética. Os Finlandeses acabariam por enfrentar a União Soviética em duas guerras, a Guerra do Inverno de 1939 e a Guerra da Continuação de 1941 (Eliasson, 2004). Em ambos os conflitos, apesar de conseguir defender seus núcleos territoriais da ocupação Russa, a Finlândia fora forçada a ceder territórios por meio de armistícios para a União Soviética. Sobre a liderança do presidente Paasikivi, começando em 1939 a política externa do país fora caracterizada por um estado de détente com a União Soviética e acomodação com o ocidente. A postura de não alinhamento dos Finlandeses pode ser vista como um esforço para manter-se no lado “oeste” da cortina de ferro e focar no seu desenvolvimento econômico (Aunesluoma e Rainio-Niemi, 2016).

O ápice da diplomacia de não alinhamento se deu com o presidente Kekkonen, que em 1975 formulou os acordos de Helsinki, assinados por todos os países Europeus, assim como os Estados Unidos e Canadá, com exceção da Albânia e da Andorra. Os acordos são considerados a pedra fundamental da arquitetura de segurança Europeia, entre seus pontos principais estavam o respeito à integridade territorial, o respeito à soberania e o não uso da força para a resolução de conflitos (Eliasson, 2004). Nos anos seguintes à Guerra Fria, a Finlândia, vendo-se sob menor ameaça de invasão Russa, começou um amplo processo de integração Europeia e aproximação com o ocidente, culminando na entrada na União Europeia em 1994. Apesar disso, a Finlândia havia decidido não entrar na Organização do Tratado do Atlântico Norte e manteve relações amistosas com a Rússia.

Através de sua neutralidade a Finlândia tornou-se uma potência diplomática, muitas vezes servindo como árbitra de conflitos internacionais e em comitês de organizações multilaterais. A invasão Russa da Ucrânia no entanto mudou completamente a perspectiva de política externa da Finlândia da noite para o dia. A atual guerra no continente Europeu despedaçou as considerações que os Finlandeses tinham com a Rússia, acreditando haver uma ameaça sobre a sua soberania por parte de uma potência revisionista e nacionalista. A Finlândia está à dar um passo monumental de mudança de paradigma de segurança ao escolher entrar na OTAN, se seu pedido será aceito ou suas expectativas serem atendidas, apenas o tempo dirá.

Referências : 

AUNESLUOMA Juhana, RAINIO-NIEMI Johanna. NEUTRALITY AS IDENTITY? FINLAND’S QUEST FOR SECURITY IN THE COLD WAR. Journal of Cold War Studies, 2016.

ENANDER Henrik. FINLAND : EARLIEST PEOPLES. Encyclopedia Britannica, 2022. Disponível em : https://www.britannica.com/place/Finland Acesso em 05 de Junho de 2022.

ELIASSON Johan. TRADITIONS, IDENTITY AND SECURITY: THE LEGACY OF NEUTRALITY IN FINNISH AND SWEDISH SECURITY POLICIES IN LIGHT OF EUROPEAN INTEGRATION. New York : Syracuse University, 2004.

ZETTERBERG Seppo. MAIN OUTLINES OF FINNISH HISTORY. This is Finland, 2017. Disponível em : https://finland.fi/life-society/main-outlines-of-finnish-history/ Acesso em 05 de Junho de 2022.