Rafaela Vale – Acadêmica do 5º semestre de Relações Internacionais da UNAMA.

Ficha técnica

Ano: 1924

Autor(a): Yevgeny Zamyatin

Gênero: Ficção científica.

Ao início do século XXX, a humanidade enfrenta as consequências de uma guerra cuja posteridade acarretou na morte de 98% da população mundial, entretanto, o restante concentrou-se em uma comunidade que aos poucos perde as memórias de uma época onde a liberdade era um direito.

O Estado Único, regime vigente no cenário distópico de Nós, do autor russo Yebgeny Zamyatin, insere indivíduos em um estilo de vida totalmente regido pelas normas, sendo estas um planejamento diário e detalhado de que cada cidadão realizará ao longo do dia, possuindo apenas breves intervalos duas vezes ao dia chamados Horas Pessoais, momentos nos quais atividades individuais e pensamentos próprios, porém limitados, podem ser exercidos.

 Além de limites quanto à rotina pessoal, a quebra da individualidade do ser humano também é feita pela despersonalização em características como nomes próprios — sendo identificados apenas por combinações de letras e números — e uniformes padronizados. Âmbitos ainda mais profundos como a habilidade de sonhar, sentir emoções ou relacionar-se naturalmente sem com um parceiro amoroso sem autorização prévia são vistos como algo negativo e punível à justiça do Benfeitor, figura vista como uma entidade superior naquele contexto.

D-503 é apenas mais um indivíduo dessa sociedade, que busca seguir rigorosamente as imposições apontadas pelo Estado Único através das Tábuas dos Mandamentos Horários, Horas Pessoais e Norma Maternal. O engenheiro demonstra constantemente a dificuldade de analisar o mundo a sua volta criticamente ou mesmo descrever os próprios sentimentos quando inicia a produção de um diário destinado a populações extraterrenas, visto que se encontra envolvido no projeto da INTEGRAL, nave espacial destinada a expandir as fronteiras da humanidade e consequentemente de seu sistema totalitário vigente.

No entanto, E-330, uma mulher intrigante que desafia o sistema, desperta no cidadão íntegro os sentimentos capazes de despertá-lo do modelo restrito no qual está inserido.

Analisada sob a ótica de Aristóteles, presente na vertente da teoria clássica das Relações Internacionais, o regime observado em Nós pode ser considerado uma forma impura de política, na qual não existe uma demonstração de iniciativa popular perante o sistema de governo tirano vigente.

De acordo com o filósofo, formas puras seriam desde a democracia ao sistema monárquico e oligarquias, que de certo modo podem ser corrompidos a se tornar algo impuro ao apresentar também mecanismos de corrupção, oligarquia e demagogia (CASTRO, 2012), como observado no Estado Único e sua representação com a figura do Benfeitor.

Escrita ao início da década de 20, a obra de Yevgeny Zamyatin resultou no exílio do autor para o exterior após a censura da União Soviética, portanto, a obra pôde ser lançada posteriormente no exterior e inspirar obras como 1984 de George Orwell, lançado em 1949 e Admirável Mundo Novo escrito por Aldous Huxley, datado de 1932.

Em suma, Nós, de Yevgeny Zamyatin, por meio de sua narrativa distópica apresenta críticas ao sistema que, mesmo décadas após seu lançamento, ainda é presente através de governos autoritários, portanto, é certamente uma leitura atemporal e interessante de analisar sob a ótica das relações internacionais.

REFERÊNCIAS

CASTRO, Thales. Teoria das relações internacionais. Fundação Alexandre de Gusmão, 2012.