Antonio Amorim – Acadêmico do 7º semestre de Relações Internacionais da UNAMA

A situação atual da Ucrânia com sua ex-república semi – autônoma, a Crimeia, é o resultado de longos conflitos oriundos do século XIX que envolveram diversos países, como França, Reino Unido, Império Otomano (atual Turquia) e etc. Contudo, a península da Crimeia é alvo de uma disputa muito maior àquelas que lhe ocorreram a tempos passados.
Para entendermos tal disputa que moldou as relações entre Estados Unidos e Rússia, como as potências que disputam a hegemonia na região hoje, é interessante recorrer ao pensamento realista do teórico John Mearsheimer em sua obra “The Tragedy of Great Power Politics” (2007). De acordo com o autor, as grandes potências percebem que a melhor forma de garantirem a sua segurança é conquistarem a hegemonia, eliminando assim qualquer possibilidade de um desafio por outra grande potência. Apenas um estado insensato perderia a oportunidade de ser o estado hegemônico do sistema por acreditar que já tenha poder suficiente para sobreviver (MEARSHEIMER, 2007, p. 48).
Diante dessa perspectiva, faz-se necessário traçar os fatos históricos que provam o porquê dessa região ser tão almejada, principalmente pela Rússia e pelos EUA. A Guerra da Crimeia, que ocorreu durante o século XIX, foi motivada pelo expansionismo do Império Russo em detrimento do declínio do Império Otomano. A França e a Grã-Bretanha temiam que o crescimento do poder russo desbalanceasse o equilíbrio do poder na região e então, passaram a apoiar os otomanos num eventual conflito.
O desfecho desse conflito deu-se por uma derrota da Rússia que foi obrigada a abrir mão de seu expansionismo e assim respeitar a integridade da Crimeia. Com o passar de dois séculos, disputas por outros motivos se desencadearam, porém, a relação russo-ucraniana sempre permaneceu, pois ambos os países possuem a mesma origem étnica.
Entre idas e vindas da História, a península da Crimeia fez parte da Rússia até 1954, quando Nikita Kruschev, primeiro-ministro da então União Soviética, transferiu a região para a Ucrânia. Entretanto, com a dissolução da URSS em 1991 e a independência de seus membros, a Crimeia passou a integrar a Ucrânia oficialmente de novo.
Então, a tensão entre Ucrânia e os russos não vem de hoje. A crise mais recente estourou após a anexação da Crimeia, então território ucraniano, pela Rússia, em 2014. O que se vê hoje em relação a Crimeia e a Ucrânia em si é um conflito de influências e interesses. Para a Rússia e os EUA, junto da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), um conflito armado seria de proporções inimagináveis dado o poderio militar de ambos, entretanto, quando lembramos da teoria de Mearsheimer (2007), percebemos que os Estados não têm certeza absoluta das intenções e ações dos outros Estados, por isso é interessante posicionar-se estrategicamente de maneira “superior” ao outro, assim garantindo uma hegemonia no sistema internacional.
Neste sentido, os esforços bélicos, logísticos e influentes na região da Ucrânia vêm se conflitando em uma escalada improvável de uma guerra (ou não). As demandas russas são de saída das tropas norte-americanas e da OTAN na região, já que o Kremlin alega que a expansão americana coloca em risco sua integridade territorial. Em relação a Crimeia, em 16 de março de 2014, realizou-se uma votação na Crimeia para que seus habitantes pudessem escolher se preferiam pertencer à Rússia ou continuar na Ucrânia, o que mostra o forte enraizamento histórico-cultural do leste ucraniano à Rússia. Muitos alegam que o referendo não foi legal, e que o resultado não foi verídico, mas, como a resposta das urnas foi uma preferência pela união à Rússia, esta logo se prontificou a implementar sua anexação.
Tal anexação até hoje não é bem vista pela comunidade internacional, então serve de gancho para os EUA se posicionarem ao longo da Ucrânia. Por fim, as disputas que ainda vigoram na Crimeia se tornaram uma competição por hegemonia na região. A Rússia nega veementemente uma invasão à Ucrânia, pois há principalmente um temor de retaliação internacional, custos financeiros e humanos. É visto que os esforços diplomáticos que envolvem esse conflito retórico ainda possuem uma enorme importância para garantir a vida e a soberania dos países envolvidos, então, afirmar se haverá uma guerra como tantos especulam é improvável.
REFERÊNCIAS
LUNKES, Daniela Sallet; PINTO, Danielle Jacon Ayres. O atual processo de construção identitária da Ucrânia: o conflito entre a tradição russa e o modelo econômico da UE. In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS. Anais do Encontro Nacional da Associação Brasileira de Relações Internacionais. João Pessoa, 2014, p. 1-12. Acesso em: 11 fev. 2022
MEARSHEIMER, J. John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Editora: Gradiva, 2007