
Alana Andrade – Internacionalista
As Relações Internacionais nascem a partir da tradição norte-americana e europeia, cuja visão de Estado-nação baseia-se na estrutura prevista nos Tratados de Westfália de 1648, o qual limita a discussão sobre política mundial pois mantém como verdade posicionamentos eurocêntricos incapazes de ver além da própria estrutura
Entretanto, a virada linguístico-epistemológica que ocorreu em várias ciências sociais, permitiu a abertura conceitual para novos horizontes, onde dentro do arcabouço teórico de RI, a abordagem feminista, de raça, e teorias pós-coloniais, e posteriormente, experiências e pensamentos dos povos tradicionais também puderam fazer parte dos pontos de vista, abrindo um leque de possibilidades de pensar o internacional de forma crítica, portanto, vindo para provar que é possível superar as amarras conceituais perpetuadas pelos países desenvolvidos e hierarquizantes em gênero e raça.
Contudo, posicionamentos analíticos a partir da indigenidade ainda são negligenciados pela área, tendo sua voz silenciada assim como há séculos ocorreu (e ainda ocorre) com povos tradicionais (PICQ, 2013). Dessa forma, se torna necessário pensar a política internacional fora da ideia de Estado-nação, abrindo o imaginário para novas formas de organização política fora do padrão dominante de produção e conhecimento. A política indigenista então, foge da caixa eurocêntrica estadista e repensa a soberania da forma como conhecemos.
Apesar disso, a falta de envolvimento teórico com esta perspectiva expõe o pensamento ainda colonial das Relações Internacionais, que iguala a indigenidade com o não-científico, não-confiável, portanto, excluído das discussões da área, considerando a ontologia indígena como inapropriada (PICQ, 2013). Todavia o Estado-nação é apenas um tipo de configuração política entre outros, havendo uma diversidade de expressões de soberania.
As organizações políticas dos povos tradicionais em sua maioria precedem o Estado moderno, logo, a indigenidade desnaturaliza o Estado como único locus político (PICQ, 2013), sendo possível pensar novas formas em como distribuir a soberania convencional, em maneiras com autoridade menos hegemônicas, o que Rudi Colloredo-Mansfield (2007) chama de “arte de governo nativas”.
À vista disso, é preciso frisar a grande diferença da abordagem indígena em relação às outras que também criticam o Estado, como as abordagens feministas e de raça, onde estas procuram ter voz dentro desta estrutura, enquanto que a indigenidade procura “menos Estado”, pois o mesmo é inadequado em reconhecer a amplitude de modelos políticos alternativos.
A importância dessa prática em RI, advém da presença indígena na própria formação dos Estados, sendo, segundo a autora, a antítese imaginada da modernidade europeia. Assim, a política indígena fez parte da emergência dos Estados e ao mesmo tempo contesta sua autoridade, pois demonstra alternativas de governança além de ir contra suas decisões.
REFERÊNCIAS:
COLLOREDO-MANSFELD, Rudi. Fighting like a community: Andean civil society in an era of Indian uprisings. University of Chicago Press, 2009.
PICQ, Manuela L. Indigenous worlding: Kichwa women pluralizing sovereignty. In: Claiming the International. Routledge, 2013. p. 135-154.