Luíza Renata Veiga Neves – Internacionalista

Em novembro de 2021 serão realizadas as eleições legislativas na Argentina, que renovam metade dos membros da Câmara dos Deputados e um terço do Senado. Para isso, neste mês de setembro foram realizadas eleições primárias, que ocorrem para definir quais serão os candidatos de cada partido que estarão na corrida do Legislativo. 

Após a eleição de Alberto Fernandez em 2019, acreditava-se que os candidatos defensores do Peronismo seriam os mais votados, contudo, os resultados das primárias mostraram que aos poucos, principalmente na região de Buenos Aires, candidatos do Juntos, partido de oposição ao atual governo, obtiveram maior número de votos. Esse crescimento do partido liderado pelo ex-presidente Macri surpreendeu os governistas e os demais países latinos (MELLO, 2021), pois nos últimos dois anos movimentos sociais têm crescido em regiões como Bolívia, Chile e na Argentina até então, com a eleição de Alberto Fernández e Cristina Kirchner.

Porém, a crise econômica na Argentina que já se estende há anos, foi agravada por conta da pandemia de COVID – 19, além do crescimento de movimentos sociais, causaram grande incômodo à base eleitoral de Macri. O reflexo disto é o resultado das eleições primárias de setembro, principalmente na capital, onde o Juntos possuiu 48,27% dos votos, contra 24,62% dos aliados de Fernández (G1, 2021).

Por mais que, até então, o apoio ao presidente Fernández ainda seja grande, a movimentação crescente da oposição liderada por Macri vai na contramão do que vem ocorrendo em diversos países na América Latina. Isso mostra que, apesar de algumas semelhanças, cada Estado possui um cenário extremamente particular, o que faz com que cada sociedade seja a real fonte de mudanças que moldam o cenário interno, consequentemente, tendo seu impacto em nível internacional.

Dentro dos estudos das Relações Internacionais (RI) existem diversas teorias utilizadas como fonte de análise, entretanto, foi próximo ao fim do século XX, que teorias pós modernas com níveis mais profundos de estudo foram criadas, como a teoria Construtivista das RI. Emmanuel Adler (1999) divide os teóricos construtivistas em três categorias: os “modernistas” onde ele se inclui, os “guiados por regras”, como Kratochwil, e o terceiro que busca aprofundar o conhecimento narrativo.

Apesar destas divisões, existem diversos pontos em comum para os construtivistas, segundo Nogueira e Messari (2005), sendo o principal o conceito de que o mundo é socialmente construído e suas mudanças advém destes movimentos da sociedade. 

Alexander Wendt (1992) também trata sobre esse conceito em Anarchy is what states make of it: the social construction of power politics ao avaliar que a realidade é socialmente construída e que diversos jogos de interesse atuando no cenário em que se é analisado. Os teóricos também convergem ao negar a antecedência no debate agente – estrutura, ou seja, que os agentes não antecedem a formação da estrutura e vice-versa, pois acreditam que ambos são construídos juntos simultaneamente.

A teoria construtivista teve como base análises sobre teorias anteriores, como neorrealista e neoliberalista, tecendo críticas por ambas abordarem o sistema internacional enquanto agentes e estrutura isolados, não avaliando a construção mútua entre eles e existem diversas relações agente – estrutura que são interligadas.

Estas observações da teoria construtivista para o sistema internacional, principalmente a visão de agente – estrutura, podem ser percebidos ao analisar o cenário atual na Argentina após as eleições primárias. Até então, a relação agente – estrutura no país era semelhante à alguns Estados latinos, onde houve o crescimento de movimentos sociais. Contudo, outros agentes, ligados à oposição liderada por Macri retomaram suas movimentações almejando mexer a atual estrutura e obter maioria na Câmara e no Senado.

O resultado das primárias favorável à oposição também causou impactos para os agentes governistas, que, tendo em vista as eleições oficiais de novembro, também estão se mobilizando para tornar a estrutura favorável para si, sendo o principal nome destas movimentações a atual vice-presidente Cristina Kirchner.

Kirchner realizou fortes discursos nos dias que antecederam as primárias, e realizou forte pressão para que o presidente escolhesse novos ministros para assumir (EL PAÍS, 2021), nomes que já ocuparam altos cargos durante o governo de Kirchner, como Aníbal Fernández e Juan Manzur, como forma de reforçar a imagem do Peronismo e tentar manter a maioria no Senado.

Durante as próximas semanas mais movimentações de agentes tanto governistas quanto da oposição ocorrerão para conquistar maior número no Legislativo, pois com o resultado das eleições primárias tornou-se nítido o desafio que ambos os lados terão, seja para retomar ou para manter-se no poder.

REFERÊNCIAS

ADLER, Emanuel. O construtivismo no estudo das Relações Internacionais. Lua Nova, n. 47, p. 201-246, 1999.

CENTENERA, Mar. Uma semana vertiginosa do peronismo argentino para recuperar votos. El País Internacional: Setembro 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/internacional/2021-09-27/uma-semana-vertiginosa-do-peronismo-argentino-para-recuperar-votos.html

COLOMBO, Sylvia. Economia argentina é um vulcão a ponto de estalar, diz Javier Milei, líder dos libertários. Folha de São Paulo: Setembro/2021. Disponível em:  https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2021/09/economia-argentina-e-um-vulcao-a-ponto-de-estalar-diz-javier-milei-lider-dos-libertarios.shtml

MELLO, Michele de. “América Latina respira novos ares”: Analistas veem nova etapa do progressismo. Brasil de Fato: Junho, 2021. Disponível em:  https://www.brasildefato.com.br/2021/06/22/america-latina-respira-novos-ares-analistas-veem-nova-etapa-do-progressismo

NOGUEIRA, João Pontes & MESSARI, Nizar. Teoria das Relações Internacionais: correntes e debates. RJ: Elsevier, 2005.

RIVAS MOLINA, Federico. Alberto Fernández relança sua gestão na Argentina com novos ministros e promessas de unidade. El País Internacional: Setembro, 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/internacional/2021-09-21/alberto-fernandez-relanca-sua-gestao-na-argentina-com-novos-ministros-e-promessas-de-unidade.html

[S.I]. Primárias de eleições para o Legislativo na Argentina mostram que frente de governistas deve perder para a oposição. G1 Mundo: Setembro, 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/09/13/primarias-de-eleicoes-para-o-legislativo-na-argentina-mostram-que-frente-de-governistas-deve-perder-para-a-oposicao.ghtml

WENDT, A. Anarchy is what states make of it: the social construction of power politics. IN: VIOTTI, Paul. KAUPPI, Mark. Intrenational Relations Theory. p. 434-458, 1992.