
Matheus Castanho Virgulino – 6° semestre
As imagens de pessoas caindo de aviões militares americanos e inundando o aeroporto de Cabul para fugir do Talibã chocaram o mundo. A história mostra que todos esses acontecimentos são frutos de um longo e doloroso processo de fragmentação do Estado Afegão, algo que dura quase 50 anos.
As origens do Talibã podem ser traçadas á invasão soviética no Afeganistão em 1979, com o objetivo de apoiar o governo socialista Afegão contra resistência interna de grupos tradicionalistas e antissocialistas, que se organizavam em guerrilhas chamadas de “Mujahidin”.
A guerra foi longa e dura, os Soviéticos não conseguindo fazer avanços significativos com exceção dos grandes centros urbanos, o terreno montanhoso do Afeganistão inibindo a capacidade bélica dos tanques e infantaria do exército vermelho que se viu forçado a lutar em situações e emboscadas desfavoráveis (OSPREY, 2004). A única vantagem óbvia dos soviéticos eram seus helicópteros de combate que davam apoio aéreo para tropas terrestres, mas mesmo estes se tornaram inconsequentes quando os americanos começaram a suprir os Mujahidin com equipamento de mísseis antiaéreos guiados.
Esta guerra de atrição fez com que o exército vermelho tomasse medidas cada vez mais duras contra a população rural. Tendo em vista que a maioria dos guerrilheiros muhajidin vinham de comunidades pastorais, e que ainda se ocupavam com trabalho no campo e de subsistência familiar, a distinção entre combatente e não combatente era gradativamente mais irrelevante para o alto comando soviético.
Isso resultou em uma campanha de guerra psicológica e econômica contra a população rural como um todo. Minas foram plantadas, plantações foram arrasadas, mulheres e crianças começaram a sofrer cada vez mais os efeitos da guerra, causando um êxodo rural que eventualmente levou a uma crise de refugiados, em especial para o Irã e o Paquistão na medida em que os mujahidin mandavam suas famílias para longe do conflito (CREWS, TARZI, 2009).
Enquanto isto, os EUA proviam armas e fundos para os mujahidin indiretamente: o Paquistão recebia armas e capital do governo americano, o qual usava para treiná-los e mandar armas através da fronteira. No entanto estas não foram as únicas formas que o Paquistão utilizou fundos americanos., junto com suporte financeiro de famílias ricas Sauditas, o serviço de inter-inteligência do Paquistão (ISI) começou a fundar centros de educação e orfanatos através de sua fronteira com o Afeganistão (FERGUSSON, 2012). Nestes internatos os filhos de soldados mujahidin que tiveram que ser exilados de seu país receberam educação islâmica e treinamento militar, a vertente do Islã sendo o Wahabismo, a mais radical e fundamentalista das escolas de pensamento muçulmanas, acreditando na implementação estrita da sharia e na luta da jihad como um dever sagrado.
Foi nesses internatos que o Talibã (que significa estudantes) começou a ser formado em 1994 por Mohammad Omar. Os soviéticos se retiraram do Afeganistão em 1989, após 9 anos de conflito com cerca de 500 mil e 2 milhões de afegãos tendo morrido, e o país em estado de caos e bandidismo.
Os diversos grupos mujahidin começaram a lutar entre si, com a capital Cabul sendo constantemente bombardeada e arrasada. Foi então que com apoio Paquistanês o Talibã entrou no Afeganistão, sendo inicialmente bem recebidos pela população local por implementar lei e dar um fim ao bandidismo dos mujahidin (FERGUSSON, 2012). Rapidamente esta boa vontade começou a transformar-se em medo quando o Talibã começou a implantar a sharia, proibindo qualquer tipo de entretenimento não tradicional, fechando as escolas para educação feminina e aplicando castigos físicos e até execuções para diversos crimes.
Em um período de três anos o Talibã tomou controle das maiores cidades do Afeganistão incluindo a capital Cabul onde o presidente foi torturado e depois executado em público, os grupos mujahidin divididos não conseguiram montar uma residência sólida.
O líder do Talibã Mohammad Omar, tomou um manto que pertencia ao profeta Maomé em Kandahar e se proclamou grande líder dos muçulmanos ou “Amir al-Mu’minin”, conseguindo mobilizar grande apoio em especial das populações étnicas Pashtuns do Afeganistão.
Por anos o Talibã presidiu sobre um reino de terror no país, com execuções sumárias sendo ocorrências rotineiras, e diversos outros grupos jihadistas tomando refúgio no Afeganistão. Tudo viria a mudar em 11 de setembro de 2001, quando o grupo terrorista “Al-Qaeda” lançou o ataque contra as Torres gêmeas nos EUA (BLOCH, 2021). O líder da Al-Qaeda Osama Bin Laden tomou refúgio no Afeganistão sobre a proteção do Talibã, quando o mesmo recusou a entregar Bin Laden o governo Americano lançou a invasão do país com a nova missão de guerra ao terror da política externa dos EUA.
Os últimos grupos mujahidin Afeganistão se juntaram na denominada Aliança do Norte, liderada por Ahmad Shah Massoud, o “leão de Panjshir”. Junto com as tropas Americanas a aliança lutou por 20 anos contra o Talibã, e apesar da recente vitória dos mesmos e a proclamação do Emirado islâmico do Afeganistão a guerra civil não dá sinais de acabar tão cedo.
Referências:
BLOCH Hannah. A LOOK AT AFGHANISTAN’S 40 YEARS OF CRISIS – FROM THE SOVIET WAR TO TALIBAN RECAPTURE. NPR, 2021. Disponível em : >https://www.npr.org/2021/08/19/1028472005/afghanistan-conflict-timeline< Acesso em 22 de Agosto de 2021.
Robert, TARZI Amin. THE TALIBAN AND THE CRISIS OF AFGHANISTAN. Harvard University Press, 2009.
FERGUSSON James. TALIBAN : THE UNKNOW ENEMY. Da Capo Press, 2012.
OSPREY. AFGHANISTAN CAVE COMPLEXES 1979-2004. Osprey Publishing, 2004.