Matheus Castanho Virgulino – Acadêmico do 6° semestre de Relações Internacionais da UNAMA

Os Balcãs são renomados por ser a região mais dividida e volátil da Europa. A primeira guerra mundial, a Guerra da Bósnia e as duas guerras Balcânicas causaram grande sectarismo e cicatrizes na região que duram até hoje. E todos estão atrelados direta ou indiretamente á ascensão e queda do império Austro-Húngaro.

O império Austro-Húngaro reinava sobre boa parte da Europa Central, se estendendo da Bohemia e Morávia ao norte, até a Dalmácia no Adriático, assim como da Áustria em si ao leste da  Baviera até a Hungria e Transilvânia nas montanhas Carpatos e a planície da Pannonia. A história do império está diretamente atrelado a história da família que o governava, os Habsburgo, estes que foram uma das mais importantes dinastias da história da Europa (WIEDER, 2014).

Os Habsburgo ascenderam e adquiriram territórios por meio de casamentos reais e a ocupação do cargo de imperadores do Sacro Império Romano-Germânico a partir de 1452, que reinava sobre a maior parte do que é atualmente a Alemanha, Países Baixos e Itália. Após a queda da monarquia Húngara na batalha de Mohács em 1526, também conseguiram se consolidar como Reis da Hungria e Bohemia.  Isto significava então que o império Habsburgo não era um único Estado em si, mas um amontoado de territórios cujo monarca reinante era o arquiduque Habsburgo da Áustria. Isso acorrentou o efeito de não haver uma burocracia e leis unificadas no império, assim como um grande amontoado de divisões étnicas e religiosas (RADY, 2020).

O primeiro grande desafio dos Habsburgo foi a reforma protestante, que acabou por gerar a guerra dos 30 anos e enfraquecer a maior parte de seu poder sobre os príncipes do império. Além disso, os Habsburgo se viram em constante conflito contra o império Otomano, que avançava sobre a península Balcânica em territórios que os arquiduques da Áustria reivindicavam por meio de seus títulos.

A longa guerra contra os Turcos foi o processo mais consequente da história moderna da Europa Central, a escala do conflito causou com que houvesse uma mudança étnica e cultural sem precedentes; Como por exemplo os Albaneses que converteram-se ao Islã, os Sérvios que se viram exilados de seus territórios tradicionais e a grande imigração de Alemães para a Transilvânia. Todas estas mudanças seriam frutos para conflitos futuros (WIEDER, 2014).

Os Habsburgo atingiram seu ápice territorial na primeira metade do século XVIII, quando os Turcos foram expulsos da maior parte da Hungria e da Bósnia, e os imperadores aumentaram significativamente seu poder por meio do absolutismo. Mas a Áustria seria novamente desafiada, primeiro pela Prússia na guerra dos 7 anos e depois pela ascensão de Napoleão que acabaria por extinguir o Sacro Império Romano em 1806. Após a queda de Napoleão, a Áustria presidiu sobre o congresso de Viena em 1815, e sobre a direção do chanceler von Metternich fundou uma nova paz duradoura continental sustentada sobre as tradicionais monarquias do antigo regime. No entanto o avanço do liberalismo e do nacionalismo abalou a Europa com as revoluções de 1848, com a Áustria quase perdendo controle sobre a Hungria. Após serem derrotados pela Prússia em 1866 o império Austríaco perdeu a sua tradicional esfera de influência no sul da Alemanha, e o imperador Francisco José teve então que aplicar reformas, criando a monarquia dual e o império Austro-Húngaro em 1867 para garantir maior lealdade da segunda etnia mais dominante do império (JUDSON, 2016).

No entanto, a maior parte do império ainda não tinha representatividade completa e administração própria, as diversas etnias sendo postas ou sobre a parte húngara ou austríaca do império. Isso enfureceu muitos nacionalistas, e o império se viu repleto de partidos separatistas e grupos terroristas. Um destes grupos terroristas, a organização pan-eslávica Sérvia denominada “Mão Negra”, a qual assassinou o herdeiro do império Francisco Ferdinando em 1914, sendo o estopim que eclodiu a primeira guerra mundial.

A subsequente guerra contra a Sérvia, e depois contra os russos e italianos, foi devastadora para o império, com um exército ultrapassado, pesadas baixas foram sofridas em especial nas batalhas de Insonzo e na Galícia. O bloqueio continental imposto pelos Britânicos fez com que a população sofresse  alta de alimentos e a economia desmoronasse com o peso do esforço de guerra. As diversas etnias do império estavam cada vez mais enfurecidos com o governo de Viena (WATSON, 2015)

Com os tratados de Saint-Germain e Trianon em 1918 as duas partes constituintes do império foram dissolvidas, dando lugar as novas nações da Iugoslávia e Checoslováquia, com outros territórios sendo cedidos para a Romênia, Itália e Polônia. É comum a crença de que o império ruiu porque ao ser multiétnico, inevitavelmente se separou por pressão de nacionalistas e populações locais. A história real no entanto mostra que o império morreu menos por suicídio e mais por assassinato. A situação que o império se encontrava, fome, guerra, revoltas e incertezas já haviam ocorrido antes no passado com a sua integridade mantendo-se apesar do fato, o diferente desta vez é que havia um esforço deliberado das potências aliadas de dividir o império pelo princípio da autodeterminação dos povos (JUDSON, 2016)

O processo de separação no entanto não foi nem pacifico nem autodeterminante, a Hungria caiu sobre uma revolução comunista, e diversos territórios se viram em conflito com repúblicas e Estados sendo proclamados e ruindo consequentemente por anexação ou coerção dos aliados.

No restante do século XX os países que antes constituíam o império se viram governados por regimes Fascistas, com a Áustria, Croácia, Húngria e Romênia se alinhando ao eixo, e depois de sua derrota (com a exceção da Áustria) ao comunismo do bloco oriental. Os anos finais do século XX que viram a guerra da Bósnia, a democratização da Checoslováquia e Hungria e a atual crise interna enfrentada por esses países por conta do populismo são frutos diretos da dissolução do Império. Para o bem ou para o mal, o império Austro-Húngaro mudou fundamentalmente a face da Europa Central, e por consequência a dinâmica política da Europa como um todo (WIEDER, 2014).

REFERÊNCIAS :

JUDSON Pieter. THE HABSBURG EMPIRE : A NEW HISTORY. Harvard University Press, 2016.

RADY Martin. THE HABSBURGS : TO RULE THE WORLD. Nova York, Basic Books, 2020.

WINDER Simon. DANUBIA : A PERSONAL HISTORY OF HABSBURG EUROPE. Farar, Straus and Giroux, 2014.

WATSON Alexander. RING OF STEEL : GERMANY AND AUSTRIA-HUNGARY IN WORLD WAR I. Penguin Books, 2015.