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Emí Feitosa – Graduanda em Relações Internacionais

O ideal cosmopolita de Kant baseava-se no conceito que todos somos cidadãos do mundo, para um internacionalista, ou acadêmico de Relações Internacionais, essa ideia tem ligação direta com sonhos e possibilidades para além das fronteiras nacionais. De certa forma, esta ideia me levou a seguir um caminho longe da minha zona de conforto, mais perto do pensamento de Kant, ser cidadã do mundo. A experiência de viver em Portugal transpassa a vida acadêmica e profissional, entrando também na esfera pessoal, sendo um círculo completo de crescimento.

O caminho que escolhi traçar começou antes de Lisboa, meus sonhos e ideias nasceram ainda em Belém, quando dentro da UNAMA, eu encontrei novas possibilidades. Tive a honra e a sorte de ter mestres, que não só me mostraram um novo mundo pela perspectiva das relações internacionais, mas também acreditaram em mim e na minha capacidade antes mesmo que eu. Professores que me inspiraram e inspiram até hoje, não só pelas capacidades acadêmicas exemplares, mas pela relação humana e afetuosa que criou um ambiente que me permitiu avançar e crescer, sendo impulsionadores dos meus sonhos, me permitindo ir além, até o outro lado do Atlântico.

Lisboa é uma das cidades mais bonitas e históricas da Europa, escrever sobre a capital de um país que já foi um dos maiores impérios da história da humanidade não é fácil, especialmente quando esta começou a ser habitada bem antes de Cristo. Culturalmente diversa, já que sofreu muitas invasões e assim, influências de tantos povos, conseguir, em poucas palavras contemplar todas as passagens históricas é impossível. Com mais de 20 séculos de história, Lisboa é um museu a céu aberto, vivendo o passado a cada esquina em uma linha do tempo quase perfeita até o século 21. A capital portuguesa está situada junto ao rio Tejo, uma breve lembrança para quem nasceu as margens da Baía do Guajará.

O Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) foi fundado em 1906 como Escola Colonial, herdando uma história centenária no mundo contemporâneo. Fazendo parte da Universidade de Lisboa, sua história começa no ano de 1290. Estudar em um local com tanta história e com um corpo docente formando por profissionais extremamente competentes e respeitados dentro da esfera acadêmica e profissional é inspirador.

Profissional e academicamente, as oportunidades de estudar em um país como Portugal são enriquecedoras. Um cenário político-econômico diferente do qual eu nasci e cresci, com mudanças, desde a moeda corrente até a estrutura governamental, Portugal sendo um regime semipresidencialista, onde o poder é dividido entre o presidente e o primeiro-ministro. Para além disso, estudar dentro da União Europeia, sendo essa uma união econômica e política, de características únicas, me deu a possibilidade de conhecer novas perspectivas em relação à ajuda e cooperação internacional, especialmente durante a pandemia da Covid-19.

O crescimento pessoal de mudar não só de país, mas de continente, é algo extremamente importante também para carreira profissional. Viver em um país estrangeiro, com hábitos alimentares, estilos de vida distintos e diferenças climáticas, imerso em uma cultura diferença da sua é um desafio. Cultura é todo aquele complexo que inclui o conhecimento, a arte, as crenças, a lei, a moral, os costumes e todos os hábitos e aptidões adquiridos pelo ser humano não somente em família, como também por fazer parte de uma sociedade da qual é membro (LARRAIA, 2001). A habilidade de se adaptar e entender outras realidades culturais ao seu redor quebra a barreira do universalismo, entender e respeitar a cultura de outro país é essencial para o mundo atual e as relações internacionais.

Existe a sensação de não ser inserido totalmente no novo país. Viver no exterior e conhecer novos lugares, ou novos estilos de vida, nos permite adquirir novos hábitos, a mudar as nossas próprias convicções, a descobrir novas paixões e objetivos. Isto, sem dúvidas, é positivo do ponto de vista pessoal, ao mesmo tempo é uma forma de se desprender das próprias raízes. O sujeito pós-moderno entende que não há uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 1987). Tem uma definição histórica, e não biológica.

As experiências e as lembranças se tornam mais importantes do que os bens materiais, o processo de adaptação ajuda a descobrir outros aspectos de nós mesmos, sobreviver e crescer fora da nossa zona de segurança nos ajuda a enfrentar todos os obstáculos a frente. De certa forma, nos forçando a desenvolver habilidades importantes na vida, as quais uma aula de escola ou trabalho do país de origem não poderiam ensinar. Se começa a sentir cidadão do mundo, viajar se torna uma questão de ser flexível, a família e amigos passam a ser prioridade na lista pessoal, os laços acabam se fortalecendo com a distância, seja com as pessoas ou a cultura.

A maneira pela qual eu vejo o mundo me molda e a minha cultura define isso, é necessário entender que este não é um conceito fixo e que a mudança de país, neste caso, acrescentou pontos na minha formação cultural, intelectual e profissional sem necessariamente alterar ou macular a minha origem. Apesar da ideia de identidade ter várias faces e teorias, é importante entender que quem nós somos nem sempre está claro ou é um conceito formado, somos resultados das nossas experiências mundanas e, para os que acreditam, espirituais.

“Not all those who wander are lost.” JRR Tolkien.

REFERÊNCIAS

Acesso em 25/07/2021: <https://www.iscsp.ulisboa.pt/pt/institucional/areas-de-atividade/unidades-de-missao/iscsp-cultura/historia?catId=813#683&gt;

Acesso em 25/07/2021: <https://www.lisboa.net/historia>

LARAIA, Roque de Barros. ​Cultura: um conceito antropológico​. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2001.

KANT, Immanuel. Ideia de uma História Universal, com um Propósito Cosmopolita. Berlim. 1784.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.