Leônidas Machado Barbosa – 4 º Semestre

A presença de mercenários nos exércitos de uma nação não é de se estranhar, durante os séculos XIV e XV houve uma grande utilização de soldados auxiliares pagos nos confrontos militares da época, muitos deles trabalhando para príncipes e duques, principalmente em regiões como a da Itália (BRITTANICA, 2013). Essas “armas contratadas” eram julgadas de ser inconfiáveis e inconstantes, podendo mesmo até fugir da batalha antes dela mesmo acontecer, um exemplo famoso foi quando o império bizantino contratou soldados espanhóis que depois acabaram saqueando cidades bizantinas.

Eventos como os que foram descritos acima acabaram tornando a reputação dos mercenários como de soldados infiéis, os quais não se podiam confiar em defender e proteger os interesses do contratante, assim tornando o uso deles na época mais como uma medida urgente ou quando não se tinha meios de criar um exército estatal. Um belo exemplo de como eles eram vistos na época é através da obra “O Príncipe” de Nicolau Maquiavel, onde o mesmo critica fortemente os mercenários:

“As mercenárias e as auxiliares são inúteis e perigosas e, se alguém tem o seu Estado apoiado nas tropas mercenárias, jamais estará firme e seguro, porque elas são desunidas, ambiciosas, indisciplinadas, infiéis; galhardas entre os amigos, vis entre os inimigos; não têm temor a Deus e não têm fé nos homens, e tanto se adia a ruína, quanto se transfere o assalto; na paz se é espoliado por elas, na guerra, pelos inimigos” (MAQUIAVEL,1532, p.48)

Portanto com base no discurso de Nicolau, se é evidente que já se havia amplo conhecimento sobre os efeitos do uso exclusivo de mercenários para defesa nacional ou de territórios, entretanto, se olharmos para o século XXI vemos que o foco da utilização dessas forças muda. A complexidade moderna na qual os conflitos chegaram, e a impossibilidade de um conflito direto entre potências devido ao poderio nuclear, fez com que os países arranjassem outros meios que fossem não oficiais e legais ao mesmo tempo, assim então se começou a ascensão dos grupos militares privados (também chamados como PMC’s).

Grupos como Blackwater e o mais recente misterioso Grupo Wagner, se mostraram estar presente nas zonas mais “quentes” de conflitos e andando lado a lado com forças estatais em inúmeras operações. O grupo americano Blackwater tem seus trajetos traçados desde da guerra do Iraque, onde lá cometeram crimes de guerra contra a população iraquiana, podendo citar o infame massacre ocorrido em Bagdá em 2007 onde 31 pessoas foram mortas ou feridas pelos contratados americanos, que entretanto, foram perdoados em 2007 pelo presidente Trump (THE NEW YORK TIMES, 2020).

Mas os Estados Unidos não são os únicos que provém dessas ferramentas, o grupo russo chamado Grupo Wagner que tem ligações fortes e diretas com a administração de Vladmir Putin se fez presente dos anos 2015 até atualmente em 2021, tendo seus feitos mais notáveis na guerra civil da Síria e na fronteira venezuelana com o Brasil. O destaque atual pode ser dado para a atual situação na República Central Africana, onde mercenários russos foram vistos em operações com os exércitos estatais e protegendo figuras políticas importantes (LE MONDE, 2021).

O uso de empresas militares privadas, abre portas para o uso de negação plausível por entidades políticas, como por exemplo a situação da Rússia na África onde o governo russo apenas tem orientadores militares na área com a empresa militar preenchendo as lacunas de soldados e de combate direto, dessa forma abrindo espaço para a negação de acusações de um envolvimento mais profundo do Estado russo.

A privatização militar no século XXI certamente mudou a visão acerca dos mercenários e em que contextos eles são melhor utilizados, podendo até afirmamos que esses são os meios atuais mais eficientes das potências exercerem sua força bélica externamente, assim como garantir sua influência em outros países de forma em que não haja um algo oficial ou uma cláusula para uma guerra em grande escala.

REFERÊNCIAS:

MACHIAVELLI, Nicoló. O Príncipe. 1532.

Britannica, The Editors of Encyclopaedia. “Mercenary”. Encyclopedia Britannica, 4 Oct. 2013, https://www.britannica.com/topic/mercenary. Accessed 13 July 2021.

BELL, Duncan. “Private military company”. Encyclopedia Britannica, 2 Nov. 2016, https://www.britannica.com/topic/private-military-firm. Accessed 13 July 2021.

CNN, Sebastian Shukla. Russian mercenaries get the big-screen treatment.28 de maio, 2021. Disponível em: < https://edition.cnn.com/2021/05/28/africa/wagner-mercenaries-tourist-film-car-cmd-intl/index.html > Acesso em: 13 de julho de 2021

THE NEW YORK TIMES, Falish Hassan e Jane Arraf. Blackwater’s Bullets Scarred Iraqis. Trump’s Pardon Renewed the Pain. 23 de dezembro de 2020. Disponível em: https://www.nytimes.com/2020/12/23/world/middleeast/blackwater-trump-pardon.htm. Acesso em: 13 de julho de 2021

LE MONDE. Putin’s ghost army’. 4 de abril de 2021. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Nl4cRvCnoVQ. Acesso em 13 de julho de 2021