Rafaela Vale (acadêmica do 3º semestre de Relações Internacionais da UNAMA)

O trabalho infantil é uma problemática presente em diversas localidades do mundo. Por se tratar de uma mão de obra relativamente barata, ou muitas vezes sem custos, momentos da infância de milhares de crianças dão lugar a uma rotina de execução de trabalhos árduos, prejudiciais para seu desenvolvimento e para seu futuro. Com isso, essa problemática se torna uma preocupação internacional.

O encargo das organizações atuantes, convenções e normas combatentes a este cenário, no ponto de vista da teoria contemporânea das Relações Internacionais, podem ser observadas como exemplos do pensamento de Andrew Linklater, teórico de vertente crítica – uma resultante do projeto da Escola de Frankfurt e sua bagagem de pensamentos de vertentes sociais.

Os ideais de Linklater vão contra a noção de individualidade estatal, defendendo uma ideia de expansão moral para além das fronteiras, através da formação de uma comunidade cosmopolita que, ao funcionar à base do diálogo, decisões importantes seriam tomadas similarmente ao funcionamento de acordos e convenções já existentes, onde os Estados se posicionam sobre as propostas.

No âmbito internacional, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) obtém um importante papel perante o enfrentamento da exploração do trabalho infantil. Sua fundação ocorreu na Conferência da Paz, no contexto do pós-Primeira Guerra Mundial, em 1919 na cidade de Paris, onde deu-se início a sua atuação a questões trabalhistas e sociais, principalmente voltando-se para resoluções de problemáticas advindas da revolução industrial. Mais tarde, em 1969, sua atuação lhe rendeu um Prêmio Nobel da Paz.

Um passo importante foi dado em junho de 1973, em Genebra, durante a Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho. A Convenção Nº 138 finalmente estabeleceria algumas normas quanto a idade mínima para a empregabilidade, quinze anos.

Uma das nações a assentir com as propostas foi o Brasil. Ademais, a nação latino-americana também se posicionou a favor da Convenção 182, que aponta e repudia as práticas mais danosas e exploratórias de trabalho infantil, como a exposição a materiais nocivos, riscos ergonômicos, ambientes extremos, abuso sexual e tráfico humano.

Um tópico comum entre as propostas de ambas as convenções, além da proteção infantil, é a concordância de que menores de 18 anos ainda sejam considerados crianças, deste modo, não devem ser expostos a qualquer tipo de condição laboral prejudicial a saúde física ou mental até o alcance da maioridade, quando já poderiam obter a liberdade de assumir quaisquer ofícios.

Em nações como o Brasil, onde há um quadro de intensa desigualdade social, a inserção de menores de idade ao trabalho informal não é incomum. De regiões rurais às grandes cidades, a prática da exploração do trabalho infantil é muitas vezes utilizada como uma complementação de renda para suas famílias. Ainda sim, de acordo com a legislação brasileira, o trabalho para menores de 14 anos não é legalmente permitido.

 O combate a essa prática é realizado ativamente no território nacional por meio de iniciativas e parcerias com diversos órgãos responsáveis pela fiscalização e auxílio a vítimas, utilizando-se de recursos legais, como é o caso do Estatuto da Criança e do Adolescente, principal conjunto de leis nacionais a respeito da proteção dos direitos dos infantojuvenis.

Além das consequências fisiológicas geradas por esforço e estresse do trabalho a um jovem indivíduo, um importante fator social também é relacionado com o trabalho infantojuvenil: a evasão escolar. As horas necessárias para dedicar-se ao trabalho, especialmente quando somada a problemática da dificuldade de acesso ao ambiente escolar, leva a muitos jovens brasileiros a abandonar os estudos.

Esse fator pode inclusive prolongar o ciclo de exploração juvenil, pois, como apresentado em Kassouf (2007), o nível de escolaridade dos pais, quanto mais baixa, pode refletir diretamente na necessidade de futuramente expor os filhos ao trabalho precoce.

O modelo específico de convenção para a tomada de decisões entre as nações, como preconizado pela OIT, é compatível com o idealizado por Linklater, no qual seguiria o fator da neutralidade, pois o poder de decisão seria igualitário entre os envolvidos, evitando um dos participantes de assumir um posto de figura autoritária. Deste modo, o enfoque permaneceria na busca pela justiça de uma forma ética e também na extensão de direitos para o grupo a ser ajudado.

Desde o ano de 2002, a data de 12 de junho é marcada pelo Dia Mundial do Combate ao Trabalho Infantil. É um evento importante onde reflexões acerca das convenções realizadas pelas Organizações Internacional do Trabalho, juntamente a iniciativas como o Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil e Fundo das Nações Unidas para a Infância podem seguir sendo feitas e divulgadas para o âmbito social, pois o cenário de abuso ainda se configura como bastante recorrente.

REFERÊNCIAS

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