
Yasmin Garcia – Acadêmica do 3º semestre de Relações Internacionais
Desde outubro de 2020, cerca de 110 países vêm debatendo com a Organização Mundial da Saúde a possibilidade da quebra de patentes das vacinas contra Covid-19 (MAZZOTO, 2021). A medida sugere a transferência de tecnologia de países desenvolvidos, para que nações menos desenvolvidas tenham a possibilidade de produzir os imunizantes a nível local. Desta forma, a desigualdade na corrida de imunização contra o Coronavírus diminuiria, consequentemente trazendo mais resultados positivos. No entanto, o assunto implica muito mais do que doar ou vender insumos: é uma questão de política externa.
A vacina tornou-se uma ótima forma de relações exteriores, de modo a mostrar o poder de determinado Estado. A exemplo disso, pode-se mencionar a Índia; esta encontra-se entre os países que defendem a quebra da patente e é uma das maiores produtoras e distribuidoras da AstraZeneca/Oxford. A nação já forneceu milhares de unidades para praticamente todos os seus vizinhos e os potenciais parceiros internacionais. No entanto, o Paquistão, por exemplo, fez-se prejudicado nessa conjuntura.
Inimigos históricos dos indianos, os paquistaneses não podem contar com a ajuda de seu vizinho. As duas região estão em constantes conflitos desde a metade do século XX pelo controle do território fronteiriço da Caxemira. O Paquistão enfrenta o que hoje é nomeado de “tsunami Covid-19”; e, se depender da Índia, não terá vacinas disponibilizadas tão cedo.
Quando nos voltamos para a realidade brasileira, percebe-se que o país perdeu uma enorme oportunidade de ser um potencial produtor de imunizantes. O Estado brasileiro se declarou contra a quebra da patente assim que Donald Trump fez o mesmo – haja vista o alinhamento automático com o presidente estadunidense. Dentre as nações emergentes, o Brasil era uma grande aposta como fabricante, devido aos laboratórios presentes no país – que são incrivelmente equipados.
Toda essa situação pode ser relacionada à Teoria da Interdependência Complexa, de Joseph Nye e Robert Keohane. Para os pensadores neoliberais, a base do tabuleiro Tridimensional, que seria o Sistema Internacional, é justamente os atores não-estatais, que abrange elementos como as Organizações Internacionais (OI’s) e Organizações Não-Governamentais (ONG’s).
Conforme esta teoria, o terceiro tabuleiro envolveria o soft power, ou “poder brando”, que se refere à dominação por meio da ideologia e da influência implícita. Sob esse viés, pode-se perceber a conjuntura ligando-se à tese de Joseph Nye. O autor defende que há múltiplos canais para conectar as comunidades e que o processo de barganha é extremamente preciso – além da flexibilidade das agendas (KEOHANE; NYE, 2011). A discussão sobre o fornecimento de imunizantes se enquadra aqui; Nye veria tal situação como o cenário perfeito para exercer ainda mais o soft power da Governança Global de determinados Estados.
Portanto, percebe que a temática vai muito além de uma questão de saúde: a quebra da patente de vacinas influencia demasiadamente no estabelecimento de políticas externas e relações internacionais de diversos países.
REFERÊNCIAS
1 KEOHANE, Robert O. NYE JR, Joseph S. Power & Independece. Longman: 2011.
2 MAZZOTO, Camila. Quebra de patente de vacinas: entenda o que isso significa na prática. G1 Ciência: 2021. Disponível em https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2021/05/quebra-de-patente-de-vacinas-entenda-o-que-isso-significa-na-pratica.html Acesso em 27 de maio de 2021.
3 PIMENTEL, Leonardo. Geopolítica da Vacina, o novo jogo mundial. Meio: 2021. Disponível em https://www.canalmeio.com.br/notas/geopolitica-da-vacina-o-novo-jogo-mundial/?h=QW5uYSBSZWdpbmEgIEFjY2lvbHl8NzM3MzU= Acesso em 27 de maio de 2021.