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Érica Nascimento – Acadêmica do 5° semestre de Relações Internacionais da UNAMA

Num mundo contemporâneo marcado pela pós-verdade, muitos têm se debruçado em pesquisas para entender os movimentos de construção das assim chamadas fake news como impulsionadoras de estratégias de convencimento das pessoas e de grupos sociais com vistas ao alcance de objetivos, muitas vezes políticos e econômicos. A figura de Steve Bannon, neste contexto, aparece com intensidade: suas ações e discursos indicam que ele é personagem central nesta discussão. O presente ensaio pretende ressaltar, à luz da teoria pós-moderna, como a prática discursiva expressa um domínio de poder sobre toda uma sociedade.

Michel Foucault, filósofo crítico pós-moderno, foi um dos questionadores da epistemologia positivista e, assim como outros pensadores da área, acreditava na pluralidade do conhecimento e das ideias. Logo, não haveria outra forma de estudar a produção do saber e as relações de poder, senão, considerando as suas várias possíveis interpretações, desconstruindo, assim, os postulados ortodoxos dos teóricos positivistas como se fossem dados não passíveis de discussão.

Desta forma, Foucault (1979) atesta que o saber e o poder são frutos de uma relação mútua e que o poder existe porque há um saber que o sustenta e, todo saber constitui novas relações de poder. Ou seja: não existe um saber neutro e todo conhecimento é político porque, estando ou não nas mãos do Estado, pode servir como mecanismo de produção de verdade em determinado contexto e como instrumento de dominação das populações.

Dito isto, Nogueira e Messari (2005) ressaltam que “toda verdade é a afirmação de uma posição de poder e reflete estruturas de dominação que pretendem, por meio do discurso científico, apresentar-se como neutras ou naturais”. Para Foucault, a produção do conhecimento só será válida se houver um discurso dominante e legitimado capaz de criar novas realidades, de acordo com os interesses envolvidos. (RESENDE, 2010).

Steve Bannon, ex-assessor estratégico do presidente Donald Trump, se mostrou habilidoso na produção do discurso, desempenhando um papel importante na ideologia populista do presidente, o qual, projetado pelo ex-estrategista, vem atacando instituições democráticas, acusando  jornalistas de falsidade, dizendo que pesquisas de opiniões públicas são fraudulentas, etc. (ALEXANDER, 2018). Ressalta-se que o atual líder norte-americano convidou Bannon para dirigir sua campanha e, através da empresa de assessoria política, Cambridge Analytica, o ex-assessor teve acesso a informações privadas de 87 milhões de usuários do facebook e esses perfis foram devidamente estudados como potenciais eleitores.

Especulação de assessoria similar foi observada na derrubada de Theresa May de seu cargo e na consequente ascensão de Boris Johnson ao cargo de primeiro-ministro do Reino Unido. À época, Bannon via em Johnson, mesmo não sendo considerado populista nem nacionalista, uma porta para o avanço da sua ideologia, o populismo em toda a Europa. Isso não foi diferente com o Brasil, o qual elegeu um candidato alinhado às ideias populistas. E, sem muitas assimetrias quanto à eleição norte-americana, a brasileira também utilizou as redes sociais para influenciar politicamente os eleitores, através da divulgação de narrativas falsas contra os opositores do então candidato Jair Bolsonaro (FILHO, 2019).

Esse movimento que Steve Bannon tem criado acerca do crescimento do populismo em diversas áreas do globo pode ser estudado a partir do pensamento de Foucault como a naturalização de um discurso que se legitima não apenas pela força das redes sociais, como foi observado nas eleições estadunidense e brasileira, mas pela construção de verdades padronizadas que se universalizam por meio da comunicação em rede. Tais verdades, segundo Resende (2010), criam novas realidades, sujeitos e identidades, privilegiando uns e excluindo outros. 

Diante do que se discutiu até aqui, pode-se dizer que Steve Bannon possui a habilidade que Alexander (2018) chama de mitopoética. Através dela ele consegue fazer com que ideias antidemocráticas pareçam uma verdade natural, o que assegura aos detentores de poder a sua posição privilegiada e, aqueles que aceitam essa verdade, estão consentindo serem dominados (RESENDE, 2010).

REFERÊNCIAS:

ALEXANDER, Jeffrey C. Vociferando contra o Iluminismo: a ideologia de Steve Bannon. Tradução de Maurício Hoelz. Estados Unidos: Yale University, 2018. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/sant/v8n3/2238-3875-sant-08-03-1009.pdf>. Acesso em 31 de maio de 2020.

FILHO, Alberto Rodrigues de Freitas. A batalha político-midiática do movimento Brasil Livre: mídia, gênero e sexualidade como alvos da desinformação nas redes sociais. Universidade católica de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: < https://tede2.pucsp.br/bitstream/handle/22388/2/Alberto%20Rodrigues%20de%20Freitas%20Filho.pdf>. Acesso em 31 de maio de 2020.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Organização e tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979.

NOGUEIRA, João P.; MESSARI, Nizar. Teoria das relações Internacionais: correntes e debates. Rio de janeiro: Elsevier, 2005.

RESENDE, Erica Simone Almeida. A crítica pós-moderna/pós-estruturalista nas relações internacionais. Boa Vista: Editora da UFRR, 2010.

Cambridge Analytica se declara culpada em caso de uso de dados do facebook. G1, por France Presse, 09 jan. 2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2019/01/09/cambridge-analytica-se-declara-culpada-por-uso-de-dados-do-facebook.ghtml>. Acesso em 31 de maio de 2020.

SMITH, David. Steve Bannon: We’ve turned the Republicans into a working-class party. The Guardian, Washington, 17 dez. 2019. Disponível em: < https://www.theguardian.com/us-news/2019/dec/17/steve-bannon-working-class-republicans-labour>. Acesso em 31 de maio de 2020.